Page 203 - CURSO COMPLETO DE DIREITO AGRÁRIO, Silvia C. B. Opitz e Oswaldo Opitz, Ed. Saraiva, 7ª ed., 2013
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CURSO COMPLETO DE DIREITO AGRÁRIO, Silvia C. B. Opitz e Oswaldo Opitz, Ed. Saraiva, 7ª ed., 2013



         inclusive pelo direito agrário, pois as leis que forem ditadas para orientá-lo nascem
         dessa realidade e para ela. Como veremos, a legislação agrária não ataca a proprie-
         dade rural privada em si, mas fica ao seu lado e lhe dá o respeito que merece, vi-
         sando à ordem econômica e social.
            Com a expressão "ordem econômica e social" atingimos o ponto vulnerável da
         reforma agrária brasileira, onde se dá à propriedade rural uma função social que
         não tinha semelhança nas regras sobre ela no direito civil.
             A ordem econômica e social tem por fim realizar a justiça social com base nos
         seguintes princípios: I -liberdade de iniciativa; 11- valorização do trabalho como
         condição da dignidade humana; 111-função social da propriedade; IV - harmo-
         nia e solidariedade entre os fatores de produção; V- desenvolvimento econômico;
         VI -  repressão ao abuso do poder econômico, caracterizado pelo domínio dos
         mercados, a eliminação da concorrência e o aumento arbitrário dos lucros.
             Esses princípios integram o chamado "interesse social", que permite a desa-
         propriação da propriedade territorial rural (cf. art. 160).

         5.  Art. 5Q, XXIV, da CF. Venda forçada da propriedade rural.
            Função social da propriedade. Art. 2Q da Lei n. 4.504/64
             Entendeu a Constituição destacar a desapropriação ou venda forçada da pro-
         priedade territorial rural colocando-a na parte que trata "Da Ordem Econômica e
         Financeira", sempre que se tiver de realizar a justiça social. Como na regra anterior
         (art. 5º, XXIV), não se trata de confisco, mas de aquisição mediante pagamento de
         justa indenização, embora esta se faça em títulos especiais da dívida pública com
         cláusula de preservação do valor real, resgatáveis no prazo de até 20 anos, a partir
         do segundo ano de sua emissão (CF, art.  184).
             Interessa-nos aqui, apenas o princípio da "função social da propriedade", que
         pode propiciar a desapropriação da propriedade territorial rural, pois é desta que
         trataremos agora:  "É assegurada a todos a oportunidade de acesso à propriedade
         da terra,  condicionada pela sua função  social,  na forma prevista no Estatuto da
         Terra" (Lei n. 4.504, de 30-11-1964, art. 2º).
             O  sistema brasileiro mantém o direito  subjetivo da propriedade, embora em
         caráter relativo. O princípio da função social da propriedade não é o caminho aberto,
         como vimos, para a socialização das terras rurais por parte do Estado, pois há neces-
         sidade de justificativa da venda forçada semyre mediante a indenização devida, como
         preço dela, em dinheiro e títulos públicos. E a forma legal encontrada pela Lei Maior
         para realizar a reforma agrária sem ferir o princípio do art. 5º e seu inciso XXII.

         6.  Direito subjetivo da propriedade
             A existência da propriedade, essa relação do homem com a terra,  tem sido
         invariável através dos tempos, de modo que não é com a ficção da "função social"
         que se vai contra a natureza das coisas. Aceito o direito subjetivo da propriedade
         consagrado na Constituição (art. 5º e inc. XXII), não se lhe pode dar uma condição
         substantiva, pois é mero atributo do indivíduo. A terra, por si só, não tem expressão
         alguma, porque o título de propriedade é a manifestação da atividade individual
         nos objetos que cercam o homem e estão sujeitos à sua ação. Quando esta ação é
         egoísta, impedindo-os de satisfazerem as necessidades humanas dentro da socie-
         dade, a propriedade da terra deixa de ser amparada por não realizar a justiça social.

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