Page 89 - CURSO COMPLETO DE DIREITO AGRÁRIO, Silvia C. B. Opitz e Oswaldo Opitz, Ed. Saraiva, 7ª ed., 2013
P. 89
CURSO COMPLETO DE DIREITO AGRÁRIO, Silvia C. B. Opitz e Oswaldo Opitz, Ed. Saraiva, 7ª ed., 2013
Capítulo 6
RESTRIÇÕES AO DIREITO DE PROPRIEDADE
1. Relações de vizinhança. Servidões no direito grego e romano.
Origem sagrada da servidão
É muito remota a preocupação jurídica sobre as relações de vizinhança de modo
a prevenir as dificuldades e as futuras inimizades que elas produzem em virtude da
contiguidade dos fundos. Embora se reconheça a pobreza das fontes no tocante às
diferentes servidões, é possível que se possam reconstruir algumas delas, princi-
palmente as rurais, que foram admitidas e praticadas em Atenas.
O legislador ateniense cedo se ocupou da matéria das servidões reais, e vamos
encontrar aí restrições estabelecidas ao direito absoluto de disposição e uso da
propriedade individual. Encontramos nas leis de Sólon normas disciplinadoras do
direito de vizinhança como medidas de polícia rural. Platão nos dá notícia de regras
a respeito tiradas das leis de Sólon, em seu Tratado das Leis.
Na Grécia, como em Roma, a servidão real está ligada, em sua origem, à obri-
gação sagrada de se conservar o culto aos antepassados, mantendo aceso o fogo do
lar, porque era no solo da propriedade familiar que se os enterravam. Por esse
motivo, um laço poderoso se estabeleceu entre todas as gerações duma mesma
família, fazendo dela um corpo eternamente inseparável. Cada família tinha o seu
túmulo em que os seus mortos vinham repousar juntos um após outro. Todos os do
mesmo sangue deviam ali ser enterrados ( cf. Fustel de Coulanges, Cidade antiga,
cit., p. 49-50). Foi essa devoção ao culto e à religião dos antepassados que originou
a mais antiga servidão real: a de passagem. O direito ático admitia também a ser-
vidão legal de passagem para que se pudesse chegar ao túmulo do antepassado e
ali render o culto, no caso de se ter alienado a propriedade familiar, coisa que so-
mente foi possível muito tempo depois, porque o solo em que repousam os mortos
é inalienável. Parece ser a primeira servidão real que se estabeleceu sobre uma
propriedade móvel (fundos). A razão consiste em que o solo onde repousavam os
antepassados mortos era intransferível, e a venda do prédio já recebia esse ônus, de
modo que o antigo dono tinha direito de penetrar no terreno para chegar até o tú-
mulo e levar as oferendas em dias certos. Portanto, no direito ático, a existência
dessa servidão de passagem, decorrente do encravamento do terreno onde se en-
contrava o túmulo, é certa e não padece dúvida.
87