Page 14 - ASAS PARA O BRASIL
P. 14
me levasse embora nas suas garras; está ave atormentava as minhas noites
e eu tinha pavor dela.
Mas foram as asas de um DC4 da Air France que nos trouxeram de volta
em 1946 de Buenos Aires a Paris, em um voo de umas cinquenta horas.
Durante este longo voo, eu massacrava meu irmão no jogo de xadrez. Foi o
meu batizado nos ares e meus primeiros batimentos de asas no céu.
Ninguém quis acreditar em mim quando eu disse que tinha visto baleias
através da janelinha do avião.
Eu não voltei para a França sem uma pesada bagagem e uma deficiência:
em seis anos, eu tinha aprendido os rudimentos de três idiomas; primeiro
o português, em seguida o espanhol além do francês que falávamos em
casa. Mas este aprendizado tinha sido feito de uma maneira muito
superficial e, de volta à França, eu sempre me sentia um pouco diferente,
tanto na escola quanto no dia a dia. Além disso, durante uma boa parte da
minha vida, eu sofri com a partícula do meu sobrenome e dos apelidos que
o acompanhavam: “burro”, e no exército “burette”, em português
“almotolia”.
Mais tarde, a experiência da vida me fez mudar de opinião, nunca se deve
renegar o seu nome.
Eu me sentia bem distante das camadas profundas da democracia francesa.