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Quanto maior o sacrifício, maior o poder transferido. Mal’akh havia começado sua prática com o
sangue de animais. Com o tempo, no entanto, seus sacrifícios tinham ficado mais ousados. Hoje à
noite, darei o passo que falta.
“Cuidado!”, gritou o pastor, alertando sobre a vinda do Apocalipse. “A derradeira batalha pelas
almas dos homens logo será travada!”
De fato, pensou Mal’akh. E eu me tornarei seu maior guerreiro.
É claro que essa batalha já tinha começado havia muito, muito tempo. No Antigo Egito, os
grandes adeptos tinham aperfeiçoado a Arte, evoluindo para além das massas e se tornando
verdadeiros praticantes da Luz. Eles percorriam a Terra como deuses. Construíam grandes templos de
iniciação, nos quais neófitos vindos do outro lado do mundo buscavam assimilar seu conhecimento.
Assim nasceu uma raça de homens de ouro. Durante um breve intervalo, a humanidade pareceu a
ponto de se elevar e transcender suas amarras terrenas.
A idade de ouro dos Antigos Mistérios.
Mas o homem, sendo de carne, era suscetível aos pecados da arrogância, do ódio, da
impaciência e da cobiça. Com o tempo, alguns corromperam a Arte, pervertendo-a e abusando de seus
poderes em proveito próprio. Essas pessoas começaram a invocar forças obscuras. Uma Arte diferente
se desenvolveu.., um poder mais forte, imediato e embriagante.
Essa é a minha Arte.
Essa é a minha Grande Obra.
Os adeptos iluminados e suas fraternidades esotéricas testemunharam a ascensão do mal e
viram que o homem não estava usando seu conhecimento recém-adquirido para o bem da espécie.
Portanto, eles o esconderam para mantê-lo protegido dos não merecedores. Depois de algum tempo,
esse saber se perdeu.
Com isso veio a Grande Queda do Homem.
E uma escuridão perene.
Até os dias de hoje, os nobres descendentes dos adeptos continuavam sua batalha, tateando às
cegas em busca da Luz, tentando resgatar o poder perdido e manter afastada a escuridão. Eram os
sacerdotes e as sacerdotisas das igrejas, templos e santuários de todas as religiões do planeta. O
tempo havia apagado as lembranças... afastando-os de seu passado. Eles ignoravam a Fonte de onde
outrora brotara seu poderoso conhecimento. Quando perguntados sobre os divinos mistérios de seus
antepassados, os novos protetores da fé os renegavam com veemência, condenando-os como se fosse
heresia.
Terão eles esquecido de fato?, perguntou-se Mal’akh.
Ecos da antiga Arte ainda ressoavam em todos os cantos do globo terrestre, desde os místicos
cabalistas do judaísmo até os sufis esotéricos do Islã. Seus vestígios perduravam nos misteriosos
rituais do cristianismo, em seus ritos da Santa Comunhão em que Deus era devorado, nas hierarquias
dos santos, anjos e demônios em seus cânticos e louvores, nas bases astrológicas de seu calendário
sagrado, nas vestes consagradas e na promessa de vida eterna. Até hoje, seus sacerdotes espantavam
os maus espíritos balançando incensórios cheios de fumaça, tocando sinos sagrados e borrifando água
benta. Os cristãos ainda praticavam o oficio sobrenatural do exorcismo — prática primitiva de sua fé que
exigia a capacidade não apenas de expulsar demônios, mas também de invocá-los.
E mesmo assim eles não conseguem ver seu passado...
Em nenhum outro lugar o passado místico da Igreja era mais evidente do que em seu epicentro.
Na cidade do Vaticano, no coração da praça de São Pedro, erguia-se um imenso obelisco egípcio.
Esculpido 1.300 anos antes de Jesus vir ao mundo, o portentoso monólito não tinha relevância alguma
ali, nenhum vínculo com o cristianismo moderno. No entanto, lá estava ele. No coração da Igreja de
Cristo. Um marco de pedra gritando para ser ouvido. Um lembrete para aqueles poucos sábios que
recordavam onde tudo havia começado. Aquela Igreja, nascida do ventre dos Antigos Mistérios, ainda
ostentava seus ritos e símbolos.
Um símbolo acima de todos os outros.
Adornando seus altares, vestimentas, campanários e Escrituras havia a imagem singular da
cristandade — a de um ser humano precioso e sacrificado. Mais do que qualquer outra fé, o cristianismo
compreendia o poder transformador do sacrifício. Mesmo na atualidade, para honrar a imolação de
Jesus, seus seguidores realizavam débeis gestos individuais de renúncia... jejuns, restrições na
Quaresma, dízimos.
Todas essas coisas, é claro, são impotentes. Sem sangue... não existe sacrifício de verdade.
As forças das Trevas adotavam o sacrifício de sangue havia muito tempo e, com isso, tinham se
tornado tão poderosas que o bem agora lutava para mantê-las sob controle. Em breve a Luz seria
consumida por completo e a escuridão se espalharia sem obstáculos pela mente dos homens.