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A diretora Sato estava parada ao seu lado com as mãos nos quadris, as sobrancelhas franzidas
para o teto distante. Langdon sentiu que ela estava tendo a mesma reação que muitos tinham na
primeira vez em que paravam para observar a pintura no coração de seu país.
Perplexidade total.
A senhora não é a única, pensou Langdon. Para a maioria das pessoas, quanto mais se olhava
para A Apoteose de Washington, mais estranha a pintura ficava.
— Aquele ali no painel central é George Washington — disse Langdon, apontando para o meio
da cúpula quase 60 metros acima. — Como a senhora pode ver, ele está usando vestes brancas e, com
o auxílio de 13 donzelas, ergue-se acima dos mortais sobre uma nuvem. Esse é o instante da sua
apoteose... da sua transformação em deus.
Sato e Anderson não disseram nada.
— Ao redor dele — prosseguiu Langdon —, vocês podem ver uma estranha e anacrônica série
de personagens: deuses antigos oferecendo aos nossos pais fundadores um conhecimento avançado.
Podemos ver Minerva concedendo inspiração tecnológica aos grandes inventores de nosso país: Ben
Franklin, Robert Fulton, Samuel Morse. — Langdon os apontou um a um. — E ali temos Vulcano nos
ajudando a construir um motor a vapor. Ao seu lado temos Ceres, deusa dos grãos e raiz etimológica de
nossa palavra cereal; ela está sentada sobre a colheitadeira McCormick, a inovação agrícola que
permitiu a este país se tornar líder mundial em produção de alimentos. Do lado oposto está Netuno,
demonstrando como instalar o cabo transatlântico. O afresco retrata de forma bastante clara os nossos
pais fundadores recebendo um grande saber dos deuses. — Ele abaixou a cabeça e olhou para Sato.
— Conhecimento é poder, e o conhecimento certo permite ao homem realizar tarefas milagrosas, quase
divinas.
Sato tornou a baixar os olhos para Langdon e esfregou o pescoço.
— Instalar um cabo telefônico é algo muito diferente de ser um deus.
— Para os homens modernos, pode até ser — retrucou Langdon. — Mas, se George
Washington soubesse que nós viramos uma raça com o poder de nos comunicar através dos oceanos,
voar à velocidade da luz e pisar na Lua, ele iria supor que nós nos transformamos em deuses, capazes
de tarefas milagrosas. — Ele fez uma pausa. — Nas palavras do futurista Arthur C. Clarke: “Qualquer
tecnologia suficientemente avançada é indistinguível da magia.”
Sato franziu os lábios, aparentemente entretida com os próprios pensamentos. Baixou os olhos
para a mão e, em seguida, os ergueu de volta para a cúpula, na direção apontada pelo indicador
esticado.
— Professor, o senhor foi informado de que Peter iria apontar o caminho, correto?
— Sim, senhora, mas...
— Chefe — disse Sato, virando as costas para Langdon —, pode nos fazer ver a pintura mais de
perto?
Anderson aquiesceu.
— Sim, há uma passarela que contorna a parte interna da cúpula.
Langdon olhou bem lá para cima, para a minúscula grade logo abaixo do afresco, e sentiu o
corpo se retesar.
— Não há necessidade de ir até lá em cima. — Ele já subira uma vez naquela passarela
raramente visitada, a convite de um senador e sua esposa, e quase desmaiara por causa da altura
estonteante e da precariedade da estrutura.
— Não há necessidade? — repetiu Sato. — Professor, nós temos um homem que acredita que
esta sala contém um portal capaz de transformá-lo em um deus; temos um afresco no teto que
simboliza exatamente essa transformação; e temos a mão de alguém apontando direto para essa
pintura. Parece que tudo está nos incentivando a subir.
— Na verdade — interveio Anderson, olhando para cima —, poucas pessoas sabem disso, mas
existe um painel hexagonal na cúpula que se abre como um portal e pelo qual é possível olhar e...
— Esperem um instante — disse Langdon —, vocês estão entendendo mal. O portal que esse
homem está procurando é um portal figurado... que não existe. Quando ele disse “Peter apontará o
caminho”, estava falando em termos metafóricos. O gesto da mão que aponta, com o indicador e o
polegar esticados para cima, é um símbolo conhecido dos Antigos Mistérios, e aparece na arte antiga
do mundo todo. Esse mesmo gesto aparece em três das obras-primas codificadas mais famosas de
Leonardo da Vinci: A Última Ceia, A Adoração dos Magos e São João Batista. É um símbolo da
conexão mística do homem com Deus. — Assim em cima como embaixo. A bizarra escolha de palavras
do louco começava a parecer mais relevante.
— Nunca vi esse gesto antes — disse Sato.