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FRAGMENTA HISTORICA Em torno do foral medieval da almotaçaria de
Lisboa
deveria ser posto “no cabo do foral e pustura das cartas de 1204 e 1210, concedeu ao
dalmotaçaria na folha preçedente” . Além concelho lisboeta o privilégio de dispor da
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destes, registam-se ainda no mesmo volume almotaçaria como quisesse, ordenando que
mais dois regulamentos com nome de foral: o fosse sempre do concelho . No entanto, o
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“da rrenda das varas que pertençe aa çidade” anterior preceito da escolha conjunta dos
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e o “da casa do auer do peso” . oficiais da almotaçaria foi mantido, tal como
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Relativamente à almotaçaria, esta foi uma se depreende das posturas mais antigas do
instituição concelhia, a cargo do oficial que concelho. Nestas surge também a indicação de
lhe deu o nome, o almotacé, que, por sua vez, que, à época, havia duas classes de almotacés:
correspondia à versão cristianizada de um os “grandes” (ou maiores) e os “meores” (ou
funcionário islâmico: al-muḥtasib . No foral pequenos). Os primeiros eram aqueles que os
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afonsino de 1179, e conforme notou Marcello elementos do concelho e o alcaide elegiam,
Caetano , a única menção ao concelho de sendo selecionadas vinte e quatro pessoas,
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Lisboa, enquanto assembleia de homens-bons, um par para cada mês do ano, devendo ainda
surge na frase que regulava precisamente a cada par ser composto por um cavaleiro e um
escolha daqueles oficiais: “De almutazaria. Et cidadão, ou na sua falta, por dois cidadãos.
almutazaria sit de concilio, et mittatur almutaze Já os segundos, igualmente em número de
per alcaidem et per concilium uille” . dois por cada mês, eram escolhidos pelos
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primeiros .
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Ora, e contrariamente ao que acontecia nos 29
concelhos pertencentes à tradição foraleira Depois, D. Afonso IV, entre 1340 e 1348 ,
da área de Coimbra, que seguiam o foral dado instituiu o sistema dos doze pares para todo o
a esta cidade em 1111 e cuja jurisdição da território, determinando ainda que as pessoas
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almotaçaria pertencia exclusivamente ao que ocupassem o cargo de almotacé deveriam
concelho , em Lisboa a escolha dos almotacés ser “dos melhores, e mais honrrados, que ouver
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foi dividida entre o concelho e o delegado do na Villa, e mais seem cobiica pera aguardarem
poder régio: o alcaide . D. Sancho I, através o que deuem, e que possam cumprir as
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Ordenações, que por ElRey e pelo Concelho, ou
per aquelles, que por ElRey ouverem de veer, e
18 Cf. Livro das Posturas Antigas…, pp. 116-117. 30
19 Cf. Livro das Posturas Antigas…, pp. 140-142. de Reger na dita Villa forem estabellecidos” .
20 Cf. Livro das Posturas Antigas…, pp. 175-177.
21 Cf. entrada Almotacel, em João de Sousa, Vestigios propagado a outras vilas do reino, primeiro a sul do rio
da Lingua Arabica em Portugal, Lisboa, Na Officina da Mondego e depois a sul do rio Tejo. Concretamente,
Academia Real das Sciencias, 1789, p. 51. nos forais de Povos e de Leiria de 1195, de Alcobaça
22 Marcelo Caetano, A administração municipal de de 1210, de Montemor-o-Velho, de Alenquer e de Vila
Lisboa durante a 1ª dinastia (1179-1383), Lisboa, Franca de Xira de 1212, de Torres Vedras de 1250, de
Academia Portuguesa da História, 1981, p. 17. Beja de 1254, de Estremoz de 1258, de Silves de 1266,
23 Cf. foral de Lisboa de 1179, em Portugaliae de Aguiar de 1269 e de Castro Marim de 1277, a escolha
Monumenta Historica…, vol. 1, pp. 411-415. do almotacé estava a cargo do alcaide e do concelho,
24 Concretamente, foral de Tomar de 1174, e seus estando a cargo do pretor e do concelho nos forais de
derivados, caso dos forais de Castelo do Zêzere de Odemira de 1255, de Monforte de 1257, de Vila Viçosa
1174, de Pombal de 1176, de Ourém de 1180 e de de 1270 e de Evoramonte de 1271. Cf. Portugaliae
Torres Novas (versão latina) de 1190. Cf. Portugaliae Monumenta Historica…, vol. 1, pp. 491-723. Ver,
Monumenta Historica…, vol. 1, pp. 399-403, 404-405, também, António Matos Reis, Origens dos municípios
420-421, 477-481. Ver, também, António Matos Reis, portugueses…, pp. 172-174.
Origens dos municípios portugueses, Lisboa, Livros 27 Cf. cartas régias de agosto de 1204 e de 7 de dezembro
Horizonte, 2002, pp. 143-151. de 1210, em Marcelo Caetano, A administração
25 Nos forais referidos na nota anterior aparece somente municipal de Lisboa…, pp. 124-126 e 127-129.
“almotace sit de concilio”, não sendo, por isso, regulada 28 Cf. § 2, em Posturas do Concelho de Lisboa…, p. 45
a forma de escolha dos oficiais, o que leva a pensar que (ver a primeira coluna da tabela anexa).
seria incumbência apenas do concelho. 29 Intervalo cronológico avançado por Marcelo Caetano,
26 Na verdade, também Santarém e Coimbra ao A administração municipal de Lisboa…, p. 77.
receberem um novo foral em 1179, com o mesmo 30 Cf. título “Como se devem fazer os Almotaçees nas
modelo do de Lisboa, instituíram este sistema na Villas, assy os mayores, como os meores”, em Livro das
escolha dos almotacés. Além disso, tal sistema foi ainda Leis e Posturas, pref. Nuno Espinosa Gomes da Silva;
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