Page 20 - As Crônicas de Nárnia - Volume Único
P. 20
3
UM BOSQUE ENTRE DOIS MUNDOS
Tio André e o estúdio sumiram imediatamente. Por um momento tudo
ficou turvo. Digory conseguiu ver uma suave luz verde vindo de cima e a
escuridão embaixo. Não parecia estar apoiado em coisa alguma. Nada lhe
tocava, aparentemente. “Acho que estou dentro d’água” – pensou. “Ou
debaixo d’água.” Levou um susto, mas percebeu em seguida que estava
sendo levado para cima. De súbito viu que tinha chegado ao ar livre e que
se arrastava para a relva da margem de um pequeno lago.
Quando se firmou nos pés, notou que não estava pingando, nem
respirando sem fôlego, como é de esperar que aconteça com quem tenha
estado dentro d’água. Suas roupas continuavam sequinhas.
Estava à beira de um pequeno lago com uns três metros de largura,
cercado por um bosque. As árvores ficavam tão próximas umas das outras
que não podia ver o céu. A luz existente era a luz verde coando-se através
das folhas. O sol em cima devia ser muito brilhante, pois essa luz verde era
intensa e cálida.
Não é possível imaginar bosque mais calmo. Não havia pássaros,
nem insetos, nem bichos, nem vento. Quase se podia sentir as árvores
crescendo. O lago de onde acabara de sair não era o único. Eram muitos,
todos bem próximos uns dos outros. Tinha-se a impressão de ouvir as
árvores bebendo água com suas raízes. Mais tarde, sempre que tentava
descrever esse bosque, Digory dizia: “Era um lugar rico: rico como um
panetone.”
O mais estranho de tudo era que Digory tinha praticamente se
esquecido de como viera parar ali. De qualquer modo, não se lembrava de
Polly, de tio André ou mesmo de sua mãe. Não estava assustado, excitado
ou curioso. Se alguém lhe tivesse perguntado: “De onde você veio?”,
provavelmente teria respondido: “Nunca saí daqui.” Ou, como disse depois:
“Não era um lugar onde as coisas acontecem. As árvores vão crescendo, só
isso.”
Depois de contemplar o bosque por um longo tempo, Digory notou
que havia uma menina deitada ao pé de uma árvore, ali pertinho. Seus
olhos estavam semicerrados, como se estivesse entre a vigília e o sono.
Olhou-a por um bom tempo e nada disse, até que ela falou, com uma voz
sonhadora e satisfeita: