Page 201 - As Crônicas de Nárnia - Volume Único
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cidade onde fica a corte do Tisroc...

                        - Por favor - interrompeu Shasta -, por que você não disse “que ele
                  viva para sempre”?

                        - E  por  quê!?  -  replicou  o  cavalo.  -  Fique  sabendo  que  sou  um
                  narniano livre! Por que iria usar linguagem de escravo? Não quero que ele
                  viva, e muito menos para sempre. E está na cara que você é um homem
                  livre  do  Norte.  Vamos  acabar  com  esse  palavreado  sulista!  Como  ia
                  dizendo, o meu humano está de viagem para Tashbaan, no Norte.

                        - Isso significa que é melhor a gente ir para o Sul?
                        - Não acho - respondeu o cavalo. - Ele pensa que sou mudo e burro
                  como os outros cavalos. Se eu fosse mesmo, no momento em que ficasse
                  solto iria correndo para o meu estábulo, para o meu pasto, lá no palácio
                  dele, no Sul, a dois dias de viagem daqui. É onde ele irá me procurar. Mas
                  nunca  passará  pela  cabeça  dele  que  fui  sozinho  para  o  Norte.  Ele  pode
                  imaginar também que alguém nos seguiu até aqui e me roubou.

                        - Fabuloso! - exclamou Shasta. - Vamos para o Norte. É para o Norte
                  que              eu             sempre              quis              ir            a
                  vida inteira.

                        - Sem dúvida - comentou o cavalo. - É a voz do sangue. Você para
                  mim                 só               pode                 ser               nortista.
                  Fale baixo... Já devem estar quase dormindo.

                        - Acho que vou dar uma olhada - sugeriu Shasta.

                        -       Boa        idéia,       mas        tome         muito        cuidado.
                  Estava escuro e quieto; o barulho das ondas
                        Shasta  nem  notava,  depois  de  ouvi-lo  a  vida  toda,  dia  e  noite.  Não
                  havia  luz  acesa  na  cabana.  Nem  ouviu  ruído  na  frente.  Na  única  janela
                  escutou o ronco de sempre do velho pescador. “Engraçado”, pensou, “se
                  tudo  correr  bem,  é  a  última  vez  que  escuto  esse  guincho”.  Prendendo  a
                  respiração, sentindo um pouco de pena (uma pena que não era nada, perto
                  da alegria), Shasta deslizou pela relva até a cocheira do burro, foi tateando
                  até o lugar onde estava escondida a chave, abriu a porta e achou o arreio e
                  as rédeas do cavalo. Beijou o focinho do burro: “Desculpe por não poder
                  levá-lo.”

                        - Até  que  enfim  -  disse  o  cavalo,  quando Shasta voltou.  - Já  estava
                  meio preocupado.

                        - Fui     buscar      suas      coisas      na     cocheira.      Como        é
                  que a gente coloca isto?

                        Por  alguns  minutos  Shasta  agiu  cautelosamente,  evitando  tinidos,
                  enquanto o cavalo ia dizendo: “Aperte um pouco mais a barrigueira.” “Tem
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