Page 206 - As Crônicas de Nárnia - Volume Único
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As pernas de Shasta doíam muito, mas colocou os arreios e montou.
                  Bondosamente, Bri marchou com delicadeza a tarde inteira. Quando baixou
                  o  crepúsculo,  chegaram  por  veredas  íngremes  a  um  vale  onde  havia  um
                  vilarejo. Shasta apeou e entrou na vila para comprar pão, cebola e rabanete.
                  O cavalo deu a volta pelo campo, indo encontrar o menino do outro lado.
                  Passaram a proceder desse modo, uma noite sim, outra não.

                        Eram grandes dias para Shasta, hoje melhor do que ontem, à medida
                  que  seus  músculos  se  enrijeciam  e  as  quedas  eram  menos  freqüentes.
                  Mesmo assim Bri costumava falar que ele parecia um saco de farinha em
                  cima da sela. E ainda dizia:

                        - Mesmo que não tivesse perigo algum, confesso que teria vergonha
                  de ser visto com você.

                        Apesar  das  palavras  duras,  Bri  era  um  instrutor  paciente.  Ninguém
                  ensina  equitação  melhor  do  que  um  cavalo.  Shasta  aprendeu  a  trotar,  a
                  galopar, a saltar e a manter-se na sela, mesmo quando Bri sofreava o passo
                  subitamente ou negaceava para a esquerda ou para a direita; coisas, dizia,
                  que são necessárias numa batalha.
                        Naturalmente, Shasta pedia-lhe que contasse as guerras de que havia
                  participado  com  o  tarcaã.  Bri  falava  de  marchas  forçadas,  de  caudalosos
                  rios  vadeados,  de  embates  de  cavalarias  inimigas,  quando  os  cavalos
                  guerreiam tanto quanto os homens, sendo todos eles impetuosos garanhões,
                  treinados para morder e escoicear. Mas nem sempre queria falar de guerra.

                        -  Não  toque  neste  assunto,  rapaz.  Eram  guerras  do  Tisroc  e  nelas
                  entrei  como  escravo,  como  um  cavalo  mudo.  Espere  para  me  ver  nas
                  guerras  de  Nárnia,  onde  combaterei  como  um  cavalo  livre  entre  o  meu
                  próprio  povo!  Aí,  sim,  teremos  guerras  que  merecem  ser  contadas.  Para
                  Nárnia! Para o Norte! Brá-rá-rá! Bru-ru!

                        Shasta logo aprendeu a preparar-se para um galope quando ouvia Bri
                  bradar desse jeito.

                        Depois de viajar semanas e semanas, passando por baías e enseadas,
                  rios e vilas, numa noite de luar cruzaram uma planície com uma floresta à
                  esquerda. O mar, oculto por dunas, ficava à direita, à mesma distância. De
                  repente Bri estacou.

                        - Algum problema?
                        - Psiu! - respondeu Bri, esticando o pescoço e contraindo as orelhas. -
                  Está ouvindo? Preste atenção.

                        - Parece barulho de outro cavalo, correndo entre nós e a mata.

                        - E outro cavalo. E isso não me agrada.

                        - Quem sabe é um fazendeiro chegando mais tarde?
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