Page 208 - As Crônicas de Nárnia - Volume Único
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- Mas  Bri!  A  gente  vai  morrer  também,  se  nos  pegarem.  Eu,  pelo
                  menos. Vão me enforcar como ladrão de cavalo.

                        Sentia menos medo de leão do que Bri, pois nunca havia encontrado
                  um.

                        Bri apenas fungou, encostando-se mais para a direita. Estranhamente,
                  o  outro  cavalo  pareceu  encostar  para  a  esquerda;  e  assim,  em  poucos
                  segundos,  o  espaço  entre  os  dois  tinha  ficado  bem  maior.  Foi  quando
                  ouviram  mais  dois  rugidos  de  leão,  um  à  direita,  outro  à  esquerda.  Os
                  cavalos reaproximaram-se. Os rugidos eram terrivelmente próximos, e as
                  feras pareciam acompanhar perfeitamente o galope dos cavalos. A nuvem
                  descobriu a lua e tudo se iluminou como se fosse dia claro. Os dois cavalos
                  e os dois cavaleiros corriam quase de cabeças coladas, como se estivessem
                  disputando uma corrida. Aliás (como disse Bri mais tarde), nunca se viu na
                  Calormânia uma corrida tão sensacional.

                        Shasta já se dava por perdido e começava a pensar se os leões matam
                  de uma vez ou se brincam com a vítima como faz o gato com o rato. Dói
                  muito?  Ao  mesmo  tempo  (isso  às  vezes  acontece  nos  piores  momentos)
                  observava  tudo.  Notou  que  o  outro  cavaleiro  era  uma  pessoa  pequena  e
                  delgada, vestindo uma cota de malha, na qual se refletia o luar. Montava
                  maravilhosamente bem e não tinha barba.
                        Alguma  coisa  lisa  e  brilhante  estendia-se  diante  deles.  Antes  que
                  Shasta tivesse tempo de pensar, sua boca estava cheia de água salgada. A
                  coisa brilhante era um comprido braço de mar. Ambos os cavalos nadavam,
                  e Shasta sentia a água nos joelhos. Ao ouvir um rugido enraivecido, olhou
                  para trás, e percebeu uma enorme figura peluda agachada à beira d’água -
                  só uma. Achou que o outro leão desaparecera.

                        O leão parecia achar que as presas não valiam um banho: não fez a
                  menor tentativa de continuar a perseguição. Os dois cavalos, lado a lado,
                  estavam agora no meio do braço de mar, e a praia oposta podia ser vista
                  com nitidez. O tarcaã nada dissera ainda. Shasta imaginava o que iria falar
                  quando  chegassem  do  outro  lado.  Precisava  inventar  uma  história.  De
                  repente, duas vozes falaram a seu lado.

                        - Que cansaço! - disse uma voz.

                        - Bico calado, Huin! - disse a outra.

                        “Estou  sonhando”,  pensou  Shasta.  “Sou  capaz  de  jurar  que  aquele
                  cavalo falou.”
                        Daí  a  pouco  os  cavalos  já  andavam  em  terra  sobre  seixos,  a  água
                  escorrendo de seus corpos. O tarcaã, para espanto de Shasta, não mostrou o
                  menor  desejo  de  fazer  perguntas.  Nem  mesmo  olhou  para  ele;  só
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