Page 31 - As Crônicas de Nárnia - Volume Único
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– Você ficou igualzinho a seu tio quando disse isso.

                         – Por que está fugindo do assunto? Estávamos falando sobre...

                         – Você está falando igualzinho a um homem! – disse Polly, num tom
                  de gente adulta. E acrescentou vivamente, no seu próprio tom: – E não vá
                  dizer  que  eu  também  falo  como  uma  mulher.  Não  vá  bancar  relógio  de
                  repetição.

                         – Nunca me passaria pela cabeça chamar de mulher uma garotinha
                  como você – disse Digory com arrogância.
                         – Ah, quer dizer que eu sou uma garotinha?! – Polly agora estava
                  mesmo furiosa. – Pois já não precisa se incomodar em acompanhar uma
                  garotinha. Chega! Estou cheia deste lugar! E estou farta de você também...
                  seu bestalhão... seu teimoso... burro!

                         –  Nada  disso!  –  gritou  Digory,  num  tom  ainda  mais  rude  do  que
                  pretendia, pois acabara de ver Polly enfiando a mão no bolso para agarrar o
                  anel amarelo.

                         De  maneira  nenhuma  vou  desculpar  o  que  ele  fez  em  seguida;  só
                  posso dizer que Digory se arrependeu muito depois. Antes que a mão de
                  Polly chegasse ao bolso, ele agarrou-lhe o pulso, dando-lhe uma torcida.
                  Defendendo-se  da  outra  mão  da  menina  com  o  cotovelo,  pegou  o
                  martelinho e deu no sino de ouro uma bonita martelada. Depois soltou a
                  pobre  Polly  e  ficaram  um  olhando  para  o  outro,  respirando  com
                  dificuldade. Polly já começava a chorar, não de medo, nem mesmo de dor,
                  mas  de  pura  e  forte  raiva.  Dentro  de  dois  segundos,  no  entanto,  os
                  acontecimentos iam varrer de seus corações quaisquer ressentimentos.

                         Logo ao ser golpeado, o sino dera uma nota, a doce nota que se podia
                  esperar de um sino de ouro. Mas o som, em vez de ir morrendo, continuou,
                  e continuou mais forte. No fim de um minuto era duas vezes mais alto do
                  que  no  início.  Daí  a  pouco  estava  tão  alto  que  eles  (se,  em  vez  de
                  permanecerem de boca aberta, tivessem falado alguma coisa) não poderiam
                  conversar.  E  o  som  foi  ficando  mais  forte,  mais  forte,  sempre  a  mesma
                  nota, ao mesmo tempo suave e terrível. Por fim todo o ar contido no salão
                  vibrava com o som, e podiam perceber que as pedras tremiam sob seus pés.
                  Em  seguida,  um  outro  som  entrou  na  sala,  um  barulho  confuso  e
                  desastroso, como um trem ao longe, a princípio, depois como o baque de
                  uma árvore caindo. Finalmente, com estardalhaço, uma boa parte do teto
                  despencou no fim do salão; grandes blocos de alvenaria desmoronaram em
                  volta deles; as paredes tremeram.

                         O ruído do sino parou. As nuvens de poeira sumiram. Tudo voltou à
                  antiga quietude.
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