Page 366 - As Crônicas de Nárnia - Volume Único
P. 366

– E quando chegarmos à floresta, digam lá o que disserem, acendo
                  uma fogueira e faço o jantar – declarou Trumpkin. – Mas temos é de cair
                  fora daqui. Quanto antes!

                         Nem vale a pena contar o que lhes custou subir o desfiladeiro. Mas,
                  por  estranho  que  pareça,  todos  se  sentiam  mais  animados.  A  palavra
                  “jantar” tinha produzido neles um efeito mágico.

                         Era ainda dia quando chegaram ao pinhal que tantas complicações
                  lhes  trouxera  e  acamparam  numa  cavidade  que  ficava  por  cima.  Juntar
                  lenha para a fogueira foi uma tarefa enjoada; mas depois foi esplêndido,
                  quando  as  labaredas  começaram  a  subir  e  todos  tiraram  da  bolsa  os
                  embrulhos úmidos e engordurados da carne de urso, que teriam parecido
                  repugnantes a quem tivesse passado o dia em casa. O anão era muito bom
                  de culinária. Tinham ainda algumas maçãs: cada uma foi envolvida numa
                  fatia de urso, como se fosse uma torta de maçã – só que, em vez de massa,
                  era uma camada grossa de carne – espetada num pau, para ser assada. O
                  sumo da maçã penetrou na carne, como acontece com a carne de porco com
                  molho  de  maçã.  Quando  o  urso  se  alimenta  principalmente  de  outros
                  animais, não é lá muito saboroso, mas quando come muita fruta e mel é pra
                  lá de bom; por feliz coincidência, aquele urso era exatamente desses. Foi
                  uma refeição de lamber os beiços. E no fim nem sequer havia louças para
                  lavar...  Deitaram-se,  estenderam  as  pernas  e  ficaram  conversando,
                  observando  o  fumo  que  se  elevava  do  cachimbo  de  Trumpkin.  Estavam
                  todos cheios de esperança de encontrar Caspian no dia seguinte; e tinham
                  também  a  esperança  de derrotar Miraz dentro de  poucos dias.  Claro que
                  toda  essa  boa  disposição  não  era  muito  lógica,  mas  a  verdade  é  que  se
                  sentiam felizes.

                         Não demorou que adormecessem.

                         Lúcia acordou de um sono profundo, com a sensação de que uma voz
                  (a que mais queria no mundo) a estava chamando. Pensou que talvez fosse
                  a voz do pai, mas não tinha certeza disso. Pensou depois que fosse a de
                  Pedro, mas logo viu que também não podia ser. Não tinha vontade de se
                  levantar,  não  porque  ainda  estivesse  cansada  (pelo  contrário,  sentia-se
                  extraordinariamente  repousada  e  as  dores  do  corpo  tinham  desaparecido
                  por completo), mas porque se sentia bem e extremamente feliz. Olhava a
                  lua de Nárnia, que é maior do que a nossa, e o grande céu estrelado, pois
                  tinham acampado num lugar descoberto.

                         – Lúcia! – ouviu chamar, outra vez, uma voz que não era nem do pai
                  nem de Pedro.
                         Sentou-se,  tremendo  de  excitação,  mas  sem  medo.  O  luar  brilhava
                  tanto que a paisagem florestal em redor tinha a claridade do dia, embora de
                  aspecto mais fantástico. Por detrás dela ficava o pinhal; à direita, um pouco
   361   362   363   364   365   366   367   368   369   370   371