Page 367 - As Crônicas de Nárnia - Volume Único
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longe, o desfiladeiro terminava em penedos escarpados; em frente estendia-
                  se um relvado que terminava ao alcance de uma flechada, dando lugar a
                  uma clareira, onde cresciam algumas árvores.

                         –  Parece  que  estão  mexendo!  –  falou  para  si  mesma.  –  Estão
                  andando!

                         Com o coração batendo descompassadamente, levantou-se e avançou
                  para lá. Pairava na clareira um certo murmúrio, como o que faz a ventania
                  na copa das árvores, ainda que não corresse nem a mais leve aragem. Mas
                  também  não  era  o  sussurro  costumeiro  da  folhagem.  Lúcia  sentiu  que
                  naquele  murmúrio  havia  uma  certa  melodia,  que  todavia  não  conseguia
                  captar,  assim  como  na  véspera  não  fora  capaz  de  entender  as  palavras,
                  quando as árvores pareciam falar-lhe. Mas já não podia haver dúvida de
                  que as árvores estavam andando., passando umas pelas outras e cruzando-
                  se como se executassem uma complicada dança campestre.

                         Já  estava  quase  entre  as  árvores.  A  primeira  para  a  qual  olhou
                  pareceu-lhe  ser  não  uma  árvore,  mas  um  homem  enorme,  de  barba
                  desgrenhada e grandes tufos cabeludos. Isso para ela já não era novidade, e
                  não  se  assustou.  Mas,  quando  voltou  a  olhar,  a  árvore,  se  bem  que
                  continuasse a mexer-se, era apenas uma árvore. O que não percebia bem
                  era se tinha raízes ou pés, pois quando as árvores se deslocam não andam
                  na superfície da terra: deslizam por dentro dela, como fazemos nós na água.
                  O mesmo aconteceu com todas as outras árvores. Num momento pareciam
                  encantadores gigantes, forma que assumem quando qualquer poder mágico
                  amigo  as  chama  plenamente  à  vida.  Logo  em  seguida,  voltavam  a  ser
                  simplesmente  árvores.  O  engraçado  é  que,  como  árvores,  eram  árvores
                  estranhamente humanas, e, como pessoas, eram estranhamente folhosas e
                  ramalhudas... e o tempo todo aquele ruído alegre, nascente, rumorejante.

                         –  Estão  quase  despertando!  –  disse,  sentindo-se  ela  própria  mais
                  acordada do que nunca.
                         Meteu-se pelo meio, muito confiante, dançando e saltando para um
                  lado e para o outro, temerosa apenas de que algum daqueles gigantescos
                  dançarinos esbarrasse nela. Mas isso só a preocupava um pouco, pois seu
                  desejo era ir além das árvores, ao encontro de alguma outra coisa, porque
                  fora de lá que chamara a voz querida.

                         Não  demorou  a  atingir  o  outro  lado,  perguntando  a  si  mesma  se
                  tivera de afastar os ramos com as mãos ou se fora levada pelos gigantescos
                  dançarinos.  Finalmente  saiu  da  mobilidade  confusa  dos  maravilhosos
                  contrastes de sombra e luz.

                         Em redor de um macio relvado, árvores negras bailavam. E então...
                  que alegria! No meio delas, o Grande Leão, branco de luar, projetava uma
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