Page 445 - As Crônicas de Nárnia - Volume Único
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A TEMPESTADE
Três semanas após o desembarque, saía o Peregrino da Alvorada de
Porto Estreito. As despedidas foram solenes; juntou-se grande multidão.
Houve aclamações e lágrimas quando Caspian dirigiu-se pela última vez
aos ilhéus e ao despedir-se do duque e sua família. Quando o barco se
afastou, todos ficaram silenciosos, vendo a vela purpurina tremular e
ouvindo a trompa de Caspian. A vela inflou, e sob o Peregrino da Alvorada
rolou a primeira onda das grandes, dando-lhe de novo vida. Os homens que
estavam de folga desceram, e Drinian fez a primeira inspeção à popa,
enquanto o navio virava para leste, contornando o sul de Avra.
Seguiram-se dias deliciosos. Lúcia sentia-se a garota mais feliz do
mundo quando acordava e via os reflexos do sol dançando no teto do
camarote e olhava as lindas coisas que trouxera das Ilhas Solitárias –
galochas, botas altas, capas, xales. Subia depois ao convés e olhava do
castelo da proa para o mar, de um azul cada vez mais brilhante, e aspirava o
ar cada dia mais quente. Depois chegava o café da manhã, e era aquele
apetite que só se tem nas viagens por mar.
Lúcia passava um tempão na popa jogando xadrez com Ripchip. Era
engraçado vê-lo pegar com as duas patas as peças muito grandes para ele e
esticar-se na ponta dos dedos quando tinha de fazer jogadas no centro do
tabuleiro. Era um bom jogador e, quando prestava atenção ao que estava
fazendo, era certo e sabido que ganhava. Às vezes, porém, Lúcia ganhava,
pois o rato fazia coisas incríveis, pondo um cavaleiro em perigo por causa
de uma dama ou de um castelo. De repente, esquecia-se de que estava
jogando xadrez, julgando-se em um combate real, obrigando o cavaleiro a
proceder como ele faria se estivesse no seu lugar. Pois tinha o espírito
cheio de arrebatamentos de outros tempos, de missões de morte ou glória,
de decisões heróicas.
Não durou muito essa felicidade. Uma tarde em que Lúcia olhava
sonhadoramente para o sulco ou esteira, viu amontoar-se com grande
rapidez uma enorme massa de nuvens para os lados do oeste. As nuvens
rasgaram-se num buraco e nele apareceu o sol, derramando os últimos raios
amarelos do poente. As ondas atrás do navio tomavam formas nunca vistas,
e o mar estava com uma cor castanha ou amarelada, como se estivesse sujo.
O ar ficou mais frio. O navio parecia mover-se com dificuldade, como se