Page 469 - As Crônicas de Nárnia - Volume Único
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para  um  novato  foi  um  feito  notável.  Ripchip  impediu  que  os  outros
                  atacassem:

                         – Não lutem! Empurrem!

                         Não  era  hábito  do  rato  aconselhar  alguém  a  não  lutar  e,  mesmo
                  naquele  momento  terrível,  todos  os  olhos  se  voltaram  para  ele.  Quando
                  saltou  para  o  costado  do  barco,  do  lado  de  lá  da  serpente,  e  encostou  o
                  dorso  felpudo  à  enorme  espinha  e  ao  corpo  escorregadio  e  começou  a
                  empurrar, quase todos compreenderam a sua intenção e correram para fazer
                  o mesmo.

                         Momentos depois, a cabeça da serpente apareceu de novo, desta vez
                  a bombordo, com o dorso voltado para eles, e aí então não houve quem não
                  entendesse  a  idéia  do  rato.  O  animal  havia-se  enrolado  em  volta  do
                  Peregrino e começava a apertar o laço com o seu próprio corpo. Uma vez
                  bem  apertado,  só  haveria  pedaços  de  madeira  no  lugar  do  navio,  e  a
                  serpente  apanharia  um  por  um  os  passageiros.  A  única  salvação  era
                  empurrar o laço para trás, até que deslizasse sob o costado do barco, ou
                  então (dizendo a  mesma coisa mas de outro modo) impelir o navio para
                  fora do laço.
                         Para  Ripchip,  fazer  isso  sozinho,  era  o  mesmo  que  erguer  uma
                  catedral, mas quase se matou tentando, antes que os outros o empurrassem
                  para o lado. Toda a tripulação, exceto Lúcia e o rato (que tinha desmaiado),
                  formava dois longos cordões, cada homem com o peito apoiado nas costas
                  do que estava na frente, de modo que todo o peso da fila vinha concentrar-
                  se  no  último  homem.  Era  questão  de  vida  ou  morte.  Durante  alguns
                  penosos  segundos,  nada  aconteceu.  Ossos  estalavam,  o  suor  caía,  a
                  respiração era arquejante e rouca. Então sentiram que o navio se movia e
                  que o laço da serpente estava mais afastado do mastro do que antes, mas

                  também  mais  apertado.  O  verdadeiro  perigo  estava  iminente.  Haveria
                  tempo de arrojá-lo pela popa? Ou já era tarde?
                         O  corpo  do  animal  já  se  apoiava  nas  amuradas  da  popa.  Para  lá
                  saltaram logo dez ou mais homens. Era bem melhor. O corpo estava tão
                  baixo que eles podiam formar um só cordão pela popa e empurrar uns ao
                  lado dos outros. A esperança reinou de novo até se lembrarem da parte alta
                  da  ré,  a  cauda  do  dragão  que  o  Peregrino  imitava.  Era  completamente
                  impossível fazer o animal transpor aquela parte do navio.

                         –  Um  machado!  –  gritou  Caspian,  com  voz  rouca.  –  E  continuem
                  empurrando.

                         Lúcia,  que  sabia  onde  estava  tudo,  foi  correndo  lá  embaixo  e
                  apanhou um machado. Ao atingir o alto da escada da popa, ouviu-se um
                  estrondo, como de uma árvore que tomba. O navio estremeceu todo e pulou
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