Page 476 - As Crônicas de Nárnia - Volume Único
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A ILHA DAS VOZES
O vento começou a soprar do leste, e todas as manhãs, quando a luz
surgia, a proa recurva do Peregrino elevava-se na direção do sol.
E navegaram, navegaram, impelidos por uma brisa suave, mas
contínua, e não viram peixe, nem gaivota, nem barco, nem praia. As
provisões começaram a escassear outra vez, e entrou no espírito de todos a
idéia de que talvez estivessem navegando por um mar sem fim. Mas,
quando amanheceu o último dia que tinham fixado para continuar a leste,
avistaram entre o navio e o sol nascente uma terra baixa e esfumada como
uma nuvem.
Ao meio da tarde aportaram em uma grande baía e desembarcaram.
Era um lugar muito diferente de todos os que já haviam visto, pois, ao
atravessarem a praia arenosa, depararam com um silêncio e um vazio totais,
como se fosse uma terra desabitada. Contudo, à frente estendiam-se
campos com relva tão macia e aparada como a que se costuma encontrar
nas grandes casas inglesas onde trabalham dez jardineiros. As árvores, em
grande quantidade, estavam bem separadas umas das outras, e não havia no
chão nem ramos partidos nem folhas caídas. Só se ouvia o arrulhar de
pombos. Tomaram um caminho arenoso, extenso e reto, todo ladeado de
árvores, onde não crescia uma só erva. Na outra extremidade,
vislumbraram uma grande casa acinzentada, muito sossegada ao sol da
tarde.
Lúcia reparou que tinha uma pedrinha no sapato. Numa terra
desconhecida como aquela, teria sido mais ajuizado pedir que os outros
esperassem por ela. Mas deixou-se ficar para trás e sentou-se para tirar o
sapato. O cordão tinha um nó. Antes que tivesse desatado o nó, eles já
estavam a uma distância razoável. Quando tirou a pedra e amarrava o
sapato, já não os ouvia. Quase ao mesmo tempo ouviu uma outra coisa,
mas o som não vinha do lado da casa.
Era um ruído de batidas, como se dúzias de robustos trabalhadores
estivessem golpeando o chão com toda a força com grandes pilões de
madeira. E aproximavam-se rapidamente. Ainda estava sentada e encostada
à árvore, mas como não sabia subir, só lhe restava continuar assim, muito
quieta, comprimindo-se de encontro à árvore, esperando que não a vissem.