Page 476 - As Crônicas de Nárnia - Volume Único
P. 476

9


                                                                   A ILHA DAS VOZES









                         O vento começou a soprar do leste, e todas as manhãs, quando a luz
                  surgia, a proa recurva do Peregrino elevava-se na direção do sol.

                         E  navegaram,  navegaram,  impelidos  por  uma  brisa  suave,  mas
                  contínua,  e  não  viram  peixe,  nem  gaivota,  nem  barco,  nem  praia.  As
                  provisões começaram a escassear outra vez, e entrou no espírito de todos a
                  idéia  de  que  talvez  estivessem  navegando  por  um  mar  sem  fim.  Mas,
                  quando amanheceu o último dia que tinham fixado para continuar a leste,
                  avistaram entre o navio e o sol nascente uma terra baixa e esfumada como
                  uma nuvem.
                         Ao meio da tarde aportaram em uma grande baía e desembarcaram.
                  Era  um  lugar  muito  diferente  de  todos  os  que  já  haviam  visto,  pois,  ao
                  atravessarem a praia arenosa, depararam com um silêncio e um vazio totais,
                  como  se  fosse  uma  terra  desabitada.  Contudo,  à  frente  estendiam-se
                  campos com relva tão macia e aparada como a que se costuma encontrar
                  nas grandes casas inglesas onde trabalham dez jardineiros. As árvores, em
                  grande quantidade, estavam bem separadas umas das outras, e não havia no
                  chão  nem  ramos  partidos  nem  folhas  caídas.  Só  se  ouvia  o  arrulhar  de
                  pombos. Tomaram um caminho arenoso, extenso e reto, todo ladeado de
                  árvores,  onde  não  crescia  uma  só  erva.  Na  outra  extremidade,
                  vislumbraram  uma  grande  casa  acinzentada,  muito  sossegada  ao  sol  da

                  tarde.
                         Lúcia  reparou  que  tinha  uma  pedrinha  no  sapato.  Numa  terra
                  desconhecida  como  aquela,  teria  sido  mais  ajuizado  pedir  que  os  outros
                  esperassem por ela. Mas deixou-se ficar para trás e sentou-se para tirar o
                  sapato.  O  cordão  tinha  um  nó.  Antes  que  tivesse  desatado  o  nó,  eles  já
                  estavam  a  uma  distância  razoável.  Quando  tirou  a  pedra  e  amarrava  o
                  sapato,  já  não  os  ouvia.  Quase  ao  mesmo  tempo  ouviu  uma  outra  coisa,
                  mas o som não vinha do lado da casa.

                         Era um ruído de batidas, como se dúzias de robustos trabalhadores
                  estivessem  golpeando  o  chão  com  toda  a  força  com  grandes  pilões  de
                  madeira. E aproximavam-se rapidamente. Ainda estava sentada e encostada
                  à árvore, mas como não sabia subir, só lhe restava continuar assim, muito
                  quieta, comprimindo-se de encontro à árvore, esperando que não a vissem.
   471   472   473   474   475   476   477   478   479   480   481