Page 50 - As Crônicas de Nárnia - Volume Único
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Sabemos o que acontece quando uma pessoa tem a esperança de
obter uma coisa desesperadamente desejada; parece bom demais para ser
verdade. Mas tinha de ser verdade. Tantas coisas estranhas já haviam
acontecido. E possuía os anéis. Poderia explorar, um por um, todos os lagos
do bosque. E depois... mamãe vai ficar boa. Tudo certinho de novo.
Chegou a esquecer-se da feiticeira. A mão já estava quase segurando o anel
amarelo, quando ouviu um galope de cavalo. “Que será? Algum carro de
bombeiro? Onde será o incêndio? Ih!, está vindo para cá. Ó não! É ela!”
O cabriolé foi o primeiro a surgir. Não havia ninguém na boléia. No
teto do cabriolé (não sentada, mas em pé), gingando com um equilíbrio
magnífico, surgiu da esquina, com uma roda no ar e a toda velocidade, a
rainha Jadis, o terror de Charn. Seus dentes estavam à mostra; seus olhos
relampejavam; seus compridos cabelos, caídos nas costas, brilhavam como
a cauda de um cometa. Castigava o cavalo sem pena. As ventas do animal
estavam dilatadas e vermelhas. Espumando, o cavalo galopou feito um
doido até a porta de entrada e ergueu-se sobre as patas traseiras. O cabriolé
bateu contra o poste, espalhando-se em pedaços por todos os lados. Com
um salto acrobático, a feiticeira esquivou-se a tempo do choque e foi
aterrissar no dorso do animal. Ajeitou-se na montaria e inclinou-se para a
frente, dizendo coisas ao ouvido do cavalo. Não eram certamente coisas
para acalmá-lo, mas para excitá-lo ainda mais. Outra vez ele ergueu-se
sobre as patas traseiras e começou a relinchar como se berrasse. Era todo
olhos e patas e dentes. Só um exímio cavaleiro se agüentaria em cima dele.
Antes que Digory tomasse fôlego, novas coisas começaram a
acontecer. Outro cabriolé parou aos pinotes atrás do primeiro: dele saltaram
um homem gordo vestindo sobrecasaca e um policial. Chegou depois mais
um cabriolé com dois policiais. Umas vinte pessoas (na maioria meninos
que não têm nada a fazer) apareceram em bicicletas, fazendo soar as
campainhas, dando vivas e vaias. Por fim surgiu um bando de gente a pé,
rostos afogueados com a corrida, divertindo-se a valer. Janelas abriam-se
em todas as casas da rua, e empregadas e mordomos surgiam em todas as
portas. Queriam apreciar a bagunça.
Enquanto isso, um velho senhor tentava desvencilhar-se dos restos
do primeiro cabriolé. Muitos correram para ajudá-lo, uns puxando-o para
um lado, outros para o outro. Digory imaginou que só podia ser tio André,
mas não conseguia ver-lhe o rosto, tapado e tampado pelo chapéu. O
menino saiu correndo e juntou-se à multidão.
– É esta a mulher, é esta a mulher – gritava o homem gordo,
apontando para Jadis. – Cumpra o seu dever, seu guarda! Levou coisas
valiosíssimas da minha loja. Veja só o cordão de pérolas no pescoço dela. É
meu. E além disso me deixou de olho roxo. – Puxa! – disse alguém na