Page 529 - As Crônicas de Nárnia - Volume Único
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                         Ripchip  era  a  única  pessoa  a  bordo,  além  de  Lúcia,  Edmundo  e
                  Drinian,  que  notara  o  Povo  do  Mar.  Mergulhou  mal  vira  o  rei  agitar  o
                  tridente, pois lhe parecera uma espécie de ameaça ou desafio, e quisera tirar
                  o caso a limpo. Com a excitação de descobrir que a água não era salgada,
                  esquecera-se  do  que  ia  fazer  e,  antes  de  lembrar-se  do  Povo  do  Mar,
                  Drinian e Lúcia tinham pedido a ele que não contasse nada do que vira.

                         Navegaram  a  manhã  toda  em  águas  baixas,  com  o  fundo  do  mar
                  coberto  de  capim.  Perto  do  meio-dia,  Lúcia  viu  um  grande  cardume
                  volteando por entre a erva. Comiam com vontade e moviam-se na mesma
                  direção.  “Como  um  rebanho  de  ovelhas”,  pensou  Lúcia.  De  repente  viu,
                  entre os peixes, uma donzela do mar, mais ou menos da sua idade, calma e
                  solitária, com uma espécie de cajado na mão. Lúcia teve a certeza de que
                  era uma pastora – uma pastora de peixes – e que o cardume era um rebanho
                  pastando.  Estavam  perto  da  superfície.  No  instante  em  que  a  menina  se
                  elevava  na  água  pouco  funda,  Lúcia  inclinou-se  na  beira  do  navio.  A
                  menina olhou para cima e fixou atentamente o rosto de Lúcia. A pastora
                  mergulhou depois e Lúcia nunca mais a viu. Não parecia assustada, nem
                  zangada, como os outros habitantes do mar. Lúcia simpatizara com ela, e a
                  simpatia  parecera  recíproca.  Tinham  ficado  amigas  num  minuto.  Seria
                  difícil um novo encontro, mas se isto acontecesse correriam uma para outra
                  de braços abertos.

                         O Peregrino ia sendo levado para o Oriente por um mar sem ondas,
                  sem  sombra  de  vento  ou  de  espuma  na  quilha.  A  luz  era  cada  vez  mais
                  brilhante. Ninguém dormia ou comia, mas tiravam do mar baldes de água
                  brilhante, mais forte do que o vinho e mais úmida e líquida do que a água
                  comum, bebendo-a em grandes goles, em silêncio.
                         Dois marinheiros, que começaram a viagem já com certa idade, iam
                  ficando  cada  vez  mais  novos.  Todos  a  bordo  estavam  muito  alegres  e
                  animados, mas uma animação silenciosa. Falavam às vezes, mas apenas por
                  murmúrios. Apossara-se deles a placidez daquele mar derradeiro.

                         Um dia Caspian perguntou a Drinian:

                         – O que está vendo aí em frente?
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