Page 621 - As Crônicas de Nárnia - Volume Único
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meu  dever  partir  imediatamente  da  corte  de  Vossa  Majestade,  seguindo
                  para minha pátria. Queira conceder salvo-conduto a mim e a meus amigos,
                  e alguém que nos guie em seu reino de sombras.

                         A  bruxa  nada  disse,  mas  andou  vagarosamente  pela  sala,
                  conservando os olhos fixos no príncipe. Ao chegar a uma arca não longe da
                  lareira, abriu-a, apanhando lá dentro um punhado de pó verde, que atirou ao
                  fogo. Não fez o fogo arder muito, mas um aroma muito doce e inebriante
                  encheu a sala. Durante a conversa que se seguiu o cheiro foi ficando mais
                  intenso,  dificultando  o  ato  de  pensar.  Em  seguida,  ela  pegou  um
                  instrumento  meio  parecido  com  um  bandolim  e  começou  a  tocar  um
                  repenicado monótono que se fez despercebido depois de poucos minutos.
                  Também  isso  atrapalhava  o  raciocínio.  Depois  de  ter  tocado  por  algum
                  tempo, com o aroma doce cada vez mais forte, começou a dizer numa voz
                  macia:

                         – Nárnia? Nárnia? Ouvi Vossa Alteza pronunciar esse nome durante
                  os  delírios.  Querido  príncipe,  você  está  muito  doente.  Não  há  nenhuma
                  terra chamada Nárnia.

                         –  Há  sim,  madame  –  interrompeu  Brejeiro.  –  Eu  mesmo  passei lá
                  minha vida inteira.
                         – Que interessante! – disse a bruxa. – Mas diga-me por favor uma
                  coisa: onde é essa terra?

                         – Lá em cima – respondeu Brejeiro, decidido, apontando para o teto.
                  – Mas onde fica exatamente, não sei.

                         – Como assim? – perguntou a rainha, com uma risadinha musical. –
                  Existe então um país lá em cima, no meio das pedras e do reboco do teto?

                         – Não – respondeu Brejeiro, respirando com certa dificuldade. – O
                  país fica por cima. É o Mundo de Cima.

                         – E onde fica... como é o nome... esse Mundo de Cima?
                         – Oh, deixe de bancar a boba – disse Eustáquio, que lutava contra o
                  encantamento  produzido  pelo  doce  aroma  e  o  repenicar  do  bandolim.  –
                  Como se não estivesse cansada de saber! É lá em cima, lá onde você pode
                  ver  o  céu,  o  Sol  e  as  estrelas.  Esta  é  boa!  Você  já  esteve  lá!  Nós  nos
                  encontramos lá!

                         – Peço seu perdão, irmãozinho – riu-se a bruxa, uma delícia de riso.
                  –  Não  me  lembro  desse  encontro.  Quando  sonhamos  é  que  costumamos
                  encontrar  os  nossos  amigos  em  lugares  estranhos.  Mas,  a  não  ser  que
                  sonhemos o mesmo sonho, não é razoável pedir que se lembrem.

                         – Senhora – disse o príncipe gravemente –, já lhe disse que sou filho
                  do rei de Nárnia.
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