Page 704 - As Crônicas de Nárnia - Volume Único
P. 704

meia,  Jill  e  Eustáquio  saíram  da  torre,  ainda  bocejando  e  esfregando  os
                  olhos, o anão mostrou-lhes onde poderiam colher punhados de uma erva
                  narniana chamada frésia-silvestre, que mais se parece com a nossa azedinha
                  mas  é  muito  mais  gostosa quando  cozida.  (Para  ficar  mesmo  deliciosa é
                  preciso  um  pouco  de  manteiga  e  pimenta,  mas  isso  eles  não  tinham  no
                  momento.)  Assim,  pegando  uma  coisinha  aqui,  outra  ali,  acabaram
                  juntando os ingredientes para fazer um bom cozido para o café ou almoço,
                  ou seja lá o que se quisesse chamar àquela hora do dia. Tirian avançou um
                  pouco  mais  floresta adentro e  voltou  com  galhos secos  para  fazer lenha.
                  Enquanto  a  comida  cozinhava  (o  que  lhes  pareceu  um  tempo  enorme,
                  especialmente  quando  o  cheiro  começou  a  se  alastrar,  cada  vez  mais
                  delicioso), o rei foi providenciar um traje completo para Poggin: cota de
                  malha, elmo, escudo, espada, cinto e uma adaga. Depois foi dar uma olhada
                  na espada de Eustáquio e descobriu que este a colocara de volta na bainha
                  toda lambuzada de sangue do calormano. O rei o repreendeu e o fez limpar
                  e polir a espada de novo.

                         Enquanto isso, Jill caminhava de um lado para outro, ora mexendo a
                  panela,  ora  olhando  com  inveja  para  o  unicórnio  e  o  jumento,  que
                  pastavam,  felizes  da  vida.  “Ah,  se  eu  também  pudesse  comer  capim!”,
                  pensou ela inúmeras vezes naquela manhã.

                         Mas quando chegou a hora da refeição todo mundo achou que valera
                  a pena esperar, e todos se serviram mais de uma vez. Depois de comerem
                  até  se  fartar,  os  três  humanos  e  o  anão  foram  sentar-se  nos  degraus;  os
                  quadrúpedes  deitaram-se  no  chão,  de  frente  para  eles.  O  anão  (com
                  permissão de Tirian e Jill) acendeu seu cachimbo.

                         – Agora, Poggin – disse o rei –, conte-nos tudo o que sabe sobre o
                  inimigo. Em primeiro lugar, como é que explicaram a minha fuga?

                         – Inventaram a história mais absurda que se poderia imaginar, senhor
                  –  disse  Poggin.  –  Quem  contou  foi  o  gato  Ruivo,  e  garanto  que  foi  ele
                  mesmo quem inventou tudo. Nunca vi gato mais velhaco do que esse tal de
                  Ruivo.  Pois  ele  disse  que  ia  passando  pela  árvore  à  qual  o  haviam
                  amarrado,  senhor,  e  que  Vossa  Majestade  estava  resmungando,
                  praguejando  e  amaldiçoando  Aslam.  “Numa  linguagem  que  eu  não  ouso
                  repetir”, foram as palavras que ele usou, todo empertigado e cheio de si...
                  Vossa  Alteza  bem  sabe  como  um  gato  pode  ser  metido  a  importante
                  quando quer. E então, contou Ruivo, o próprio Aslam apareceu de repente,
                  num clarão de luz, e devorou Vossa Majestade. Só de ouvir essa história,
                  todos  os  animais  estremeceram  e  houve  até  quem  desmaiasse  na  mesma
                  hora. E o macaco, é óbvio, aproveitou-se direitinho da situação, advertindo:
                  “Viram só o que Aslam faz com quem não o respeita? Que isto sirva de
                  aviso  para  todos  vocês.”  As  pobres  criaturas  se  lamentaram  e  choraram,
                  mas  aquiesceram.  Como  vê, senhor, sua  fuga não os levou a  pensar que
   699   700   701   702   703   704   705   706   707   708   709