Page 719 - As Crônicas de Nárnia - Volume Único
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Pois, na verdade, aquilo tudo mais parecia um teatro. A multidão de
                  narnianos seria o povo sentado nas poltronas; o pequeno gramado à frente
                  do  estábulo,  onde  se  acendia  a  fogueira  e  onde  o  macaco  e  o  capitão
                  postavam-se  em  pé  para  falar  à  multidão,  parecia  o  palco;  e  o  estábulo
                  propriamente  dito  seria  o  cenário  aos  fundos  do  palco.  Para  completar,
                  Tirian  e  seus  amigos  seriam  os  “penetras”,  que  espiavam  por  detrás  do
                  cenário. Era uma excelente posição. Se, por acaso, algum deles desse pelo
                  menos um passo na direção do clarão da fogueira, no mesmo instante todos
                  os olhos se fixariam nele. Por outro lado, enquanto permanecessem quietos
                  à sombra da parede do estábulo, a possibilidade de serem vistos era quase
                  nula.

                         Rishda Tarcaã empurrou o macaco para mais perto do fogo. Os dois
                  encararam a multidão (o que significava, obviamente, que agora estavam
                  de costas para Tirian e seus amigos).

                         – Agora, Mico – disse Rishda, bem baixinho –, transmite as palavras
                  que mentes mais sábias colocaram na tua boca. E levanta a cabeça! – Dito
                  isso, aplicou-lhe um pequeno chute ou cutucão por trás, com  a ponta do
                  dedão do pé.

                         – Deixe-me em paz! – resmungou Manhoso. Depois empertigou-se e
                  começou a falar, agora em voz alta. – Agora, escutem bem, todos vocês.
                  Aconteceu uma coisa terrível. Uma desgraça! A coisa mais desprezível que
                  já se fez em Nárnia. Aslam...
                         – Tashlam, seu idiota! – sussurrou Rishda. –... quero dizer, Tashlam,
                  naturalmente – emendou o macaco –, está muito zangado por isso.

                         Um  pesado  silêncio  caiu  sobre  os  narnianos  enquanto  esperavam
                  para  ouvir  que  nova  desgraça  lhes  estava  reservada.  Até  o  grupinho
                  escondido atrás da parede prendeu a respiração. O que viria agora?

                         – Sim – disse o macaco. – Neste exato momento, em que o Temível
                  Ser  encontra-se  entre  nós  (ali  mesmo  no  estábulo,  bem  atrás  de  mim),
                  algum animal  miserável resolveu fazer o que ninguém sequer imaginaria
                  que  alguém  fosse  capaz  de  fazer,  mesmo  que  ele  estivesse  a  milhas  e
                  milhas daqui. O dito animal vestiu uma pele de leão e anda vagando por
                  essas matas, fingindo ser Aslam.

                         Jill, por um momento, pensou que o macaco tivesse enlouquecido.
                  Será que ele ia contar toda a verdade? Um urro de horror e de fúria partiu
                  dos animais. “Grrrr!”, rosnaram, indignados. “Quem é ele? Onde está? Ah,
                  se eu ponho os dentes nele!”

                         –  Ele  foi  visto  a  noite  passada  –  continuou  o  macaco  –,  mas
                  desapareceu. É um  jumento. Um simples e miserável asno! Se algum de
                  vocês vir aquele...
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