Page 759 - As Crônicas de Nárnia - Volume Único
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“É mentira! Não porque ele e eu sejamos um, mas por sermos o oposto um
                  do outro é que tomo para mim os serviços que tens prestado a ele. Pois eu e
                  ele somos tão diferentes, que nenhum serviço que seja vil pode ser prestado
                  a mim, e nada que não seja vil pode ser feito para ele. Portanto, se qualquer
                  homem  jurar  em  nome  de  Tash  e  guardar  o  juramento  por  amor  a  sua
                  palavra, na verdade jurou em meu nome, mesmo sem saber, e eu é que o
                  recompensarei.  E  se  algum  homem  cometer  alguma  crueldade  em  meu
                  nome, então, embora tenha pronunciado o nome de Aslam, é a Tash que
                  está  servindo,  e  é  Tash  quem  aceita  suas  obras.  Compreendes  isto,  filho
                  meu?”  Eu  respondi:  “Senhor,  tu  sabes  o  quanto  eu  compreendo.”  E,
                  constrangido pela verdade, acrescentei: “Mesmo assim, tenho aspirado por
                  Tash todos os dias da minha vida.” “Amado”, falou o glorioso ser, “não
                  fora o teu anseio por mim, não terias aspirado tão intensamente, nem por
                  tanto tempo. Pois todos encontram o que realmente procuram.”

                         – Depois ele soprou sobre mim e fez cessar todo o tremor do meu
                  corpo, firmando-me outra vez sobre os meus pés. Após isso, não disse mais
                  muita  coisa,  a não  ser  que  voltaríamos a  nos  encontrar  e que  eu  deveria
                  seguir sempre para a frente e sempre para cima. Então voltou-se como uma
                  tempestuosa rajada de ouro e subitamente desapareceu.

                         – E desde então, ó reis e damas, ando perambulando à procura dele, e
                  minha felicidade é tão imensa que até me enfraquece como uma ferida. E a
                  maravilha das maravilhas é ter ele me chamado de amado – a mim, que não
                  passo de um cão...

                         – Epa! Que estória é essa? ! – exclamou um dos cães.
                         –  Senhor  –  desculpou-se  Emeth  –,  é  apenas  uma  forma  de  dizer
                  usada na Calormânia.

                         – Bem, para dizer a verdade, ela não me agrada nem um pouquinho –
                  resmungou o cachorro.

                         – Ele não quis ofender ninguém – disse um cão mais idoso. – Afinal
                  de contas, lá em casa chamamos nossos filhotes de meninos quando não se
                  comportam direito...

                         –  Nós  também  chamamos  –  disse  o  primeiro  cachorro.  –  Ou  de
                  meninas...

                         – Psiu!!! – disse o velho cão. – Isso não é jeito de falar. Lembre-se
                  de onde você está!
                         – Olhem! – disse Jill, de repente.

                         Alguém vinha vindo, meio timidamente, ao encontro deles. Era uma
                  criatura  graciosa,  de  quatro  patas  e  cor  cinza-prateada.  Todos  a  fitaram,
                  boquiabertos,  durante  alguns  instantes,  até  que  cinco  ou  seis  vozes
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