Page 99 - Os Manuscritos do Mar Morto
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paralelos são encontrados na estrutura textual. Quando colocadas lado a lado, as
passagens bíblicas hinárias apresentam concordâncias, ou ao menos aproximações
estruturais que convencem o interpretante de que houve contribuições e/ou adaptações.
Entre os escritos joaninos, além de se encontrarem paralelos na terminologia, as
idéias expressas por João são também semelhantes a diversas passagens dos
pergaminhos. Os textos atribuídos a João compõem uma fonte muito rica para se
entender as diferentes formas assumidas pelo cristianismo nascente. Ajudam a entender
também que as influências não ocorriam na totalidade de um determinado movimento,
mas sim em particular, em correntes de pensamento particulares.
Nos textos paulinos, vemos as maiores semelhanças na teologia. Não existem
paralelos entre algumas das idéias de Paulo quando comparadas a outros livros do NT.
Mas, convincentemente, percebe-se que a relação com alguns aspectos da teologia da
comunidade do mar Morto é muito próxima. O que se depreende frente a isto é que
existem escritos cristãos que apresentam maiores proximidades com os textos
qumrânicos, outros não.
Para que se busquem essas relações é necessário definir critérios para
caracterizar a existência de paralelos. Entre os cuidados que têm de ser tomados, um dos
principais está em saber que um paralelo não significa necessariamente um empréstimo.
Algumas passagens talvez indiquem que o uso de determinado termo foi algo corrente
na Palestina no século I, não pertencendo exclusivamente a um determinado grupo
religioso. Por sua vez, afirmar que houve um empréstimo direto de um lugar para outro
tem uma diferença muito grande. Por isso, mais do que apenas identificar um paralelo, é
necessário também que se mostre o “caminho” deste, e se de fato ele se caracteriza
como um empréstimo, já que o afrontamento de passagens correlatas tidas como
análogas em textos diversos podem na verdade ser meras coincidências; ou numa
situação mais típica, ser fruto de um ambiente maior.
A explicação de como um determinado documento foi influenciado ou recebeu
empréstimos é fundamental para provar a existência de paralelos. Um exemplo
lembrado entre escritores que tratam do tema é o de Lorenzo Valla (1406-1457). Ele
demonstrou que o famoso documento conhecido como Constitutum Constantini era uma
fraude. Ao fazer uma análise filológica do documento, Valla provou que algumas
expressões lingüísticas encontradas eram implausíveis para a suposta datação do
documento, início do século IV (c.f. ECO, 1997:81-82; LE GOFF, 1984:100). A análise
lingüística do documento feita por Valla é uma das técnicas fundamentais para que as