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fazê-lo. Suas decisões causaram ENTENDIMENTO JURÍDICO
apreensão entre os colegas e o Cada ente federado pode efetivamente proibir a realização de culto presencial, em
ministro Marco Aurélio criticou- dadas fases da epidemia? Há plausibilidade na tese sustentada pela autora, segundo
-o chamando-o simplesmente a qual a proibição total da realização de cultos religiosos presenciais representa uma ex-
de “novato”. O Plenário acabou trapolação de poderes, pois trata o serviço religioso como algo supérfluo, que pode ser
revertendo sua decisão sobre a suspenso pelo Estado, sem maiores problemas para os fiéis. Essa visão do fenômeno re-
liberação dos cultos por nove ligioso, no entanto, não tem respaldo constitucional. Antes, ao contrário, a Constituição
votos a dois. Também a legiti- de 1988, embora consagre expressamente a separação entre igrejas e Estado (CF, art. 19,
I), estabelece um conjunto de garantias para que a liberdade religiosa possa ser exercida
midade da associação de juristas em toda a sua dignidade – por exemplo, quando admite a convicção religiosa como moti-
evangélicos foi desconstituída vo para a recusa ao serviço militar obrigatório (CF, art. 143, parágrafo 1º c/c art. 5º, VIII);
pelo Plenário. quando tolera o ensino religioso (CF, art. 210, parágrafo 1º); quando atribui efeitos civis
Também ficou vencido quan- ao casamento religioso (CF, art. 226, parágrafo 2º) etc. (...) A proibição categórica de cultos
do o Plenário, por oito votos a não ocorre sequer em estados de defesa (CF, art. 136, parágrafo 1º, I) ou estado de sítio
(CF, art. 139). Como poderia ocorrer por atos administrativos locais? Certo, as questões
três, decidiu pela incompetência sanitárias são importantes e devem ser observadas, mas, para tanto, não se pode fazer
da 13ª Vara Federal de Curitiba tábula rasa da Constituição. Observa-se, nesse sentido, que diversas atividades também
para processar e julgar os casos essenciais, tais como o serviço de transporte coletivo, vêm sendo desenvolvidas ainda que
do tríplex no Guarujá (SP), do em contexto epidêmico, demandando para tanto um protocolo sanitário mínimo que, com
sítio em Atibaia (SP) e de duas as devidas considerações, poderia ser também adotado no presente caso. (...) Reconheço
ações envolvendo o Instituto que o momento é de cautela, ante o contexto epidêmico que vivenciamos. Ainda assim, e
justamente por vivermos em momentos tão difíceis, mais se faz necessário reconhecer a
Lula. Nunes Marques foi quem essencialidade da atividade religiosa, responsável, entre outras funções, por conferir aco-
abriu a divergência. Em sua opi- lhimento e conforto espiritual. (ADPF 701)
nião, os crimes atribuídos a Lula É possível fazer a cumulação da remição da pena por estudo e por trabalho realizados
têm relação com a Petrobras. de forma concomitante? A lei permite a remição da pena em decorrência de realização
Assim, a competência de outro concomitante de trabalho e estudo, desde que haja compatibilidade de horário, valen-
juízo seria, no máximo, concor- do destacar a dicção do artigo 126, parágrafo 3º, da Lei de Execução Penal: “Para fins de
rente. Mas como a defesa não cumulação dos casos de remição, as horas diárias de trabalho e de estudo serão definidas
de forma a se compatibilizarem.” Por outro lado, é certo que há limitação máxima de oito
apontou a vara competente para horas diárias (art. 33 da LEP) à jornada de trabalho e de quatro horas diárias (art. 126, I,
processar os feitos, a 13ª Vara da LEP) ao período de frequência escolar considerado para efeito de remição por estudo.
Federal Criminal de Curitiba Entendo, entretanto, que há independência entre os limites máximos diários de jornada
seria apta para isso. de trabalho (oito horas) e de frequência escolar (quatro horas), podendo o condenado, em
Em questões processuais jul- razão de trabalho e estudo, cumular a remição, contanto que não sejam ultrapassados re-
gadas no Plenário, mostrou-se feridos limites, individualmente considerados. (...) Desse modo, não vislumbro, nos autos,
fundamentação idônea para negar à recorrente o direito à remição por estudo realizado em
legalista. Foi assim no julga- concomitância com trabalho. (RHC 187.940)
mento sobre a impenhorabilida-
de de pequena propriedade ru-
ral para o pagamento de dívidas. Acompanhou o ministro Alexandre de Moraes para entender
Divergiu do relator, ministro não ser possível o reconhecimento de uniões estáveis simultâneas
Edson Fachin, e defendeu que a para fins previdenciários. Na área processual penal, acompanhou
validade da hipoteca oferecida a maioria para entender que servidor investigado por lavagem de
como garantia real desautoriza dinheiro não pode ser afastado automaticamente, em entendimen-
a impenhorabilidade: “Admitir to garantista. Também foi garantista ao concordar que a Fazenda
o contrário se constituiria, a um Pública não pode decretar a indisponibilidade de bens sem decisão
só tempo, em enriquecimen- judicial ou direito ao contraditório.
to ilícito, bem como em clara No julgamento que definiu que o Estado pode obrigar a popu-
violação do princípio da boa-fé lação a ser vacinada, apresentou ressalvas sobre a obrigatoriedade,
objetiva.” O ministro Gilmar “medida extrema, apenas para situação grave e cientificamente jus-
Mendes o acompanhou, mas o tificada e esgotadas todas as formas menos gravosas de intervenção
Plenário, por seis a cinco, reco- sanitária”. Defendeu que a vacinação obrigatória pode ser sancio-
nheceu a impenhorabilidade. nada por medidas indiretas, como a imposição de multas.
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