Page 60 - História de uma Gaivota e do Gato que a ensinou a voar
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- Não. Há um humano que não está na lista - apontou Zorbas.
- O que vive com a Bubulina.
Bubulina era uma bonita gata branca e preta que passava longas horas
entre os vasos de flores de um terraço. Todos os gatos do porto passavam
lentamente à frente dela, ostentando a elasticidade dos seus corpos, o
brilho das suas pelagens esmeradamente asseadas, o comprimento dos
seus bigodes, o garbo dos seus rabos empinados, com a intenção de a
impressionar, mas Bubulina mostrava-se indiferente e apenas aceitava
os carinhos de um humano que se instalava no terraço diante de uma
máquina de escrever.
Era um humano esquisito, que às vezes se ria depois de ler o que
acabava de escrever, e outras vezes amachucava as folhas sem as ler. O
seu terraço estava sempre envolvido numa música suave e melancólica
que adormecia Bubulina e provocava fundos suspiros nos gatos que por
ali passavam.
- O humano da Bubulina? Porquê ele? - quis saber Colonello.
- Não sei. Esse humano inspira-me confiança - reconheceu Zorbas. -
Ouvi-o ler o que escreve. São palavras belas que alegram ou entristecem,
mas que produzem sempre prazer e suscitam o desejo de continuar a
ouvir.
- Um poeta! O que aquele humano faz chama-se poesia. Volume
dezassete, letra "P", da enciclopédia - garantiu Sabetudo.
- E o que te leva a pensar que esse humano sabe voar? - quis saber
Secretário.
- Talvez não saiba voar com asas de pássaro, mas ao ouvi-lo sempre
pensei que voa com as palavras - respondeu Zorbas.
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