Page 200 - As Viagens de Gulliver
P. 200

pensei ouvir o som estranho de alguma coisa a raspar no lado da caixa que tinha
      os grampos pregados, e logo a seguir comecei a ter a sensação de que a caixa
      estava a ser puxada ou sirgada através do mar, pois de vez em quando sentia uma
      espécie de esticões que levantavam vagas junto do cimo das janelas, deixando-
      me  quase  completamente  às  escuras.  Isto  acordou  em  mim  umas  débeis
      esperanças  de  salvação,  apesar  de  não  perceber  como  isso  se  daria.  Tentei
      desatarraxar uma das cadeiras, que continuavam presas ao chão, para, com uma
      certa dificuldade, pregá-las de novo mesmo debaixo da janelinha do teto, que eu
      já  antes  abrira,  e,  trepando  para  cima  da  cadeira,  aproximei  a  minha  boca  o
      mais que pude do orifício e gritei por socorro em todas as línguas que conhecia.
      Em seguida atei o meu lenço a um bastão que costumava trazer sempre comigo
      e,  introduzindo-o  pelo  buraco,  acenei  várias  vezes  com  ele,  para  que  os
      marinheiros, se de fato era de um barco que se tratava, percebessem que havia
      um infeliz mortal fechado na caixa.

















          Não  obtive  qualquer  resposta  a  tudo  o  que  tentei,  mas  percebia
      distintamente que a minha caixa continuava a ser deslocada, até que, uma hora
      depois ou mais, o lado da caixa sem janela, e que tinha os grampos fixos, chocou
      contra alguma coisa dura. Receei que fosse uma rocha e senti-me mais agitado
      do que nunca. Ouvi claramente um barulho sobre a tampa da caixa, que parecia
      o de  um  cabo  e  o seu  raspar  ao  ser passado  pela  argola.  Senti-me,  então,  ser
      içado gradualmente, pelo menos três pés mais alto do que me encontrava antes,
   195   196   197   198   199   200   201   202   203   204   205