Page 201 - As Viagens de Gulliver
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acenando  de  novo  nessa  altura,  com  o  meu  bastão  e  lenço,  e  gritando  por
      socorro,  até  ficar  quase  sem  voz.  Em  resposta  a  isto  ouvi  um  grande  grito
      repetido três vezes, que me encheu de uma alegria de tal maneira grande que só
      poderá ser compreendida por aqueles que já a sentiram. Ouvia agora o ruído de
      passos sobre a minha cabeça e alguém chamando através da janelinha, com voz
      forte e na minha língua: “Se há alguém aí em baixo, que diga.” Respondi que era
      um  inglês  que,  por  desventura,  sofrera  a  maior  calamidade  por  que  jamais
      alguma criatura passou e pedi-lhes que, por tudo o que tinham de mais querido,
      me  tirassem  daquela  masmorra.  A  voz  replicou  que  eu  estava  a  salvo,  pois  a
      minha caixa se encontrava amarrada ao seu barco e que o carpinteiro depressa
      viria e abriria um buraco na tampa, suficientemente grande para me poderem
      tirar de lá. Respondi que isso não valia a pena e demorava muito tempo; que nada
      havia  de  mais  simples  que  um  dos  marinheiros  passar  o  dedo  pela  argola  e
      colocar a caixa a bordo, levando-a depois ao camarote do capitão. Alguns deles,
      ouvindo-me dizer  todos  estes  disparates, pensaram  que  eu  estava  louco, outros
      riram-se,  pois  não  me  passou  pela  cabeça  que  agora  me  encontrava  entre
      pessoas da minha estatura e força. O carpinteiro veio e em poucos minutos abriu
      uma passagem de cerca de quatro pés de lado, introduzindo por ela uma pequena
      escada,  pela  qual  subi,  sendo  logo  depois  levado  para  o  barco  num  estado  de
      grande fraqueza.
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