Page 102 - O Poderoso Chefao - Mario Puzo_Neat
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— Espero que possamos acertar as coisas esta noite — adiantou Michael calmamente — não
quero que aborreçam mais o meu pai.
— Não mais o aborrecerão — retrucou Sollozzo sinceramente. — Juro pelos meus filhos que
não mais o aborrecerão. Seja compreensivo quando falarmos. Espero que você não seja
“esquentado” como o seu irmão Sonny. Ê impossível tratar de negócios com ele.
— Ele é um bom menino, é um menino direito — ajuntou o Capitão Mc Cluskey. Inclinou-se
para dar uma palmadinha cordial no ombro de Michael e prosseguiu: — Lamento o que
aconteceu na outra noite, Mike. Estou ficando muito velho para o meu trabalho, muito rabugento.
Acho que vou ter de me aposentar muito cedo. Não posso suportar contrariedade, o dia todo eu
tenho contrariedades. Você sabe como é.
Depois, com um suspiro melancólico, passou uma revista completa em Michael, a fim de
verificar se ele estava armado.
Michael percebeu um leve sorriso nos lábios do motorista. O carro seguia para o oeste sem
qualquer tentativa aparente de despistar quem quer que o tivesse seguido. Prosseguiu na direção
da estrada de West Side, aumentando e diminuindo a velocidade. Qualquer carro que o estivesse
seguindo teria de fazer o mesmo. Então, para consternação de Michael, ele tomou o caminho de
saída para a Ponte George Washington, estavam indo para Nova Jersey. Quem quer que tivesse
fornecido a Sonny a informação sobre o lugar em que se realizaria a reunião tinha dado uma
informação errada.
O carro foi abrindo caminho pelas vias de acesso da ponte e daí a pouco estava
atravessando-a, deixando a cidade resplandecente para trás. Michael mantinha o rosto
impassível. Iriam eles atirá-lo nos pântanos ou era apenas uma modificação de última hora do
lugar da reunião feita pelo astuto Sollozzo? Mas, quando estavam quase inteiramente do outro
lado, o motorista deu uma virada violenta na direção. O pesado automóvel deu um salto no ar
quando atingiu a linha divisória e caiu com força nas vias de retorno a Nova York. Tanto
McCluskey quanto Sollozzo olhavam para trás para ver se alguém tentava fazer a mesma coisa.
O veículo agora voltava para Nova York e logo eles estavam fora da ponte e se dirigindo ao
Bronx, no leste da cidade. Atravessaram ruas laterais sem qualquer carro atrás deles. Já eram
então quase nove horas. Tinham-se assegurado de que ninguém estava seguindo a pista deles.
Sollozzo acendeu um cigarro depois de oferecer o maço a McCluskey e Michael, tendo ambos
recusado. Sollozzo disse para o motorista:
— Belo trabalho. Não esquecerei isso.
Dez minutos mais tarde, o carro parou em frente de um restaurante numa pequena zona de
italianos. Não havia ninguém nas ruas e devido ao adiantado da hora apenas poucas pessoas ainda
estavam jantando. Michael teve receio de que o motorista entrasse com eles no restaurante, mas
ele permaneceu lá fora com o carro. O intermediário não mencionara o motorista, ninguém o
mencionara. Tecnicamente, Sollozzo infringira o acordo trazendo-o consigo. Mas Michael
resolveu não falar no assunto, sabendo que pensariam que ele estava com medo de falar nisso,
para não estragar as possibilidades de êxito das negociações.
Os três sentaram-se numa única mesa redonda existente, tendo Sollozzo recusado a sentar-se
num reservado. Havia apenas duas outras pessoas no restaurante. Michael pensou que talvez
fossem homens de Sollozzo. Mas não importava. Antes que eles pudessem intervir, estaria tudo
terminado.
McCluskey perguntou com verdadeiro interesse:
— Será que a comida italiana é boa aqui?
Sollozzo tranqüilizou-o:
— Experimente a vitela, é a melhor de Nova York.
O garçom solitário trouxe uma garrafa de vinho para a mesa e abriu-a.
Encheu três copos. Surpreendentemente McCluskey não bebeu.
— Devo ser o único irlandês que não bebe — afirmou ele. — Tenho visto muita gente boa se
meter em complicação por causa da bebida.