Page 104 - O Poderoso Chefao - Mario Puzo_Neat
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dela, procurando uma arma. Michael mostrou-se ofendido. McCluskey disse rispidamente:
    — Eu o revistei. Tenho revistado milhares de caras dessa idade. Ele está desarmado.
    Sollozzo  não  gostou  disso.  Por  qualquer  motivo,  não  gostou  disso.  Olhou  para  o  homem
  sentado na mesa em frente à deles e levantou as sobrancelhas na direção da porta do banheiro. O
  homem respondeu com um ligeiro aceno de cabeça de que havia revistado o banheiro, de que
  não havia ninguém lá dentro. Finalmente, Sollozzo disse com relutância:
    — Não demore muito.
    Ele tinha antenas maravilhosas, estava nervoso.
    Michael levantou.se e dirigiu-se para o banheiro. O mictório tinha uma barra de sabão cor-
  de-rosa segura por uma rede de arame. Ele entrou num reservado. Tinha realmente de fazê-lo,
  seus intestinos estavam soltos. Descarregou muito rapidamente, depois procurou atrás da caixa de
  descarga  esmaltada  até  que  sua  mão  tocou  na  pequena  arma,  com  a  coronha  e  o  gatilho
  recoberto com fita. Desamarrou a arma, lembrando-se do que Clemenza dissera para não se
  preocupar em deixar as impressões digitais na fita. Meteu a arma na cintura e abotoou o paletó
  por cima dela. Lavou as mãos e molhou o cabelo. Apagou as suas impressões digitais da torneira
  com o lenço. Depois saiu da privada.
    Sollozzo estava sentado diretamente de frente para a porta da privada, com seus olhos pretos
  brilhando de vivacidade. Michael sorriu.
    — Agora posso falar — disse ele com um suspiro de alívio.
    O Capitão McCluskey jantava a vitela com o espaguete que tinha chegado. O homem da
  parede distante, que estava nervosamente atento, agora também se tornou visivelmente tranqüilo.
    Michael sentou-se novamente. Lembrou-se de que Clemenza aconselhara a não fazer aquilo,
  que saísse da privada e atirasse. Mas ou devido a algum instinto de advertência ou por simples
  medo ele não fez assim. Percebera que se tivesse feito um movimento rápido teria sido morto.
  Agora se achava mais seguro e devia estar apavorado, pois se sentia contente por não estar mais
  em pé. Notava as pernas fracas e trêmulas.
    Sollozzo  estava  inclinado  na  direção  dele.  Michael  com  a  barriga  escondida  pela  mesa,
  desabotoou o paletó, e ficou ouvindo atentamente, embora não conseguisse entender uma palavra
  do que o outro dizia. Aquilo era um palavreado oco para ele. Sua mente se achava povoada de
  sangue martelante, que nenhuma palavra registrava. Por baixo da mesa, sua mão direita moveu-
  se na direção da arma metida na sua cintura e ele a soltou. Nesse momento, o garçom veio saber
  o que eles queriam para comer, e Sollozzo virou a cabeça para atendê-lo. Michael empurrou a
  mesa para longe dele com a mão esquerda, enquanto a mão direita impelia a arma quase contra
  a cabeça de Sollozzo. Sua coordenação era tão perfeita que ele já começara a desviar-se ante o
  movimento de Michael. Mas este, sendo mais jovem, com os reflexos mais apurados, puxou o
  gatilho. A bala atingiu Sollozzo em cheio entre o olho e o ouvido, e quando saiu pelo outro lado
  atirou uma enorme mancha de sangue e fragmentos de crânio no paletó do petrificado garçom.
  Instintivamente Mike sabia que uma bala era bastante. Sollozzo virara a cabeça naquele último
  momento e Michael vira a luz da vida extinguir-se nos olhos do homem tão claramente como o
  apagar de uma vela.
    Um segundo apenas se passara quando Michael girou para apontar a arma na direção de
  McCluskey. O capitão da polícia olhou para Sollozzo com surpresa fleumática, como se isso nada
  tivesse a ver com ele. Parecia não ter conhecimento do seu próprio perigo. O seu garfo coberto
  de vitela estava suspenso em sua mão e seus olhos estavam justamente virando-se para Michael.
  E a expressão do seu rosto, de seus olhos, denunciava uma afronta tão presunçosa, como se agora
  ele esperasse que Michael se entregasse ou fugisse, que Michael sorriu para ele quando puxou o
  gatilho. Este tiro pegou mal, não foi mortal. Atingiu McCluskey em sua grossa garganta de touro e
  ele começou a engasgar-se espalhafatosamente como se tivesse engolido um grande pedaço de
  vitela. Então o ar como que se encheu de uma fina névoa de sangue vaporizado que ele tossindo
  expelia dos pulmões arrebentados. Muito friamente, muito calculadamente, Michael disparou o
  tiro seguinte no alto do crânio coberto de cabelo branco do capitão.
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