Page 229 - O Poderoso Chefao - Mario Puzo_Neat
P. 229
casados passavam horas de amor febril. Michael não se cansava de contemplar o corpo
lindamente esculturado de Apollonia, sua pele cor de mel, seus enormes olhos castanhos
cintilando de paixão. Ela exalava um cheiro maravilhosamente fresco, um cheiro de carne
perfumada pelo sexo. A paixão virginal dela se equiparava à lascívia nupcial dele e
freqüentemente já era quase manhã quando eles caíam no sono completamente esgotados. Às
vezes, cansado mas ainda indisposto para dormir, Michael sentava-se no peitoril da janela e
contemplava o corpo nu da esposa enquanto ela dormia. O rosto dela também era adorável
quando em repouso, um rosto perfeito que ele vira antes somente em livros de arte de Madonnas
italianas pintadas, as quais, sem qualquer esforço quanto à capacidade do artista, podiam ser
consideradas virginais.
Na primeira semana do casamento, fizeram piqueniques e pequenas viagens no Alfa Romeo.
Mas então Don Tommasino levou Michael para um canto e explicou que o casamento tornara
sua presença e identidade conhecidas de todos naquela parte da ilha e deviam ser tomadas
precauções contra os inimigos da Família Corleone, cujos longos braços também se estendiam ao
refúgio daquela ilha. Dom Tommasino pôs guardas armados em torno da vila, enquanto os dois
pastores, Calo e Fabrizzio, eram os vigias dentro dos muros. Assim, Michael e esposa tinham de
ficar no terreno da villa. Michael passava o tempo ensinando Apollonia a ler e escrever inglês e a
dirigir o carro ao longo dos muros internos da villa. Por essa época, Don Tommasino parecia
andar preocupado e não era boa companhia, estava ainda tendo dificuldades com a nova Máfia
na cidade de Palermo, explicara o Dr. Taza.
Uma noite, no jardim, uma velha aldeã que trabalhava na casa como criada trouxe um prato
de azeitonas frescas; depois virou-se para Michael e perguntou:
— É verdade o que todo mundo anda dizendo, que o senhor é filho de Don Corleone de Nova
York, o Padrinho?
Michael viu Don Tommasino balançar a cabeça contrariado com o conhecimento geral do
seu segredo. Mas a velha estava olhando para ele de maneira tão interessada, como se fosse
importante que ela soubesse a verdade, que Michael acenou com a cabeça afirmativamente.
— Você conhece o meu pai? — perguntou ele.
O nome da mulher era Filomena e o seu rosto era tão enrugado e castanho como uma noz, os
dentes cobertos de sarro despontavam na boca semi cerrada. Pela primeira vez, desde que
Michael estava na villa, ela sorriu para ele.
— O Padrinho salvou a minha vida uma vez — disse ela — e meus miolos também — e fez
um gesto apontando a cabeça.
Ela obviamente queria alguma coisa mais, assim Michael riu para encorajá-la.
A velha perguntou quase com medo:
— É verdade que Luca Brasi está morto?
Michael acenou com a cabeça novamente e ficou surpreso com o olhar de alívio no rosto da
velha. Filomena persignou-se e disse:
— Deus me perdoe, mas que a alma dele queime no inferno eternamente.
Michael lembrou-se de sua antiga curiosidade sobre Brasi, e teve a repentina intuição de que
essa mulher sabia a história que Hagen e Sonny se recusaram a contar-lhe. Ele serviu um copo
de vinho à mulher e fê-la sentar-se.
— Conte-me o que você sabe sobre meu pai e Luca Brasi — pediu ele gentilmente. — Sei
um pouco, mas como eles se tornaram amigos e por que Brasi era tão dedicado ao meu pai? Não
tenha medo, vamos, conte-me.
O rosto enrugado de Filomena, seus olhos pretos voltaram-se para Don Tommasino, que de
algum modo fez sinal dando-lhe permissão. E assim Filomena passou uma parte da noite
contando-lhes a sua história.
Há cerca de trinta anos, Filomena era parteira em Nova York, na Nona Avenida, servindo à
colônia italiana. As mulheres estavam sempre grávidas e ela prosperava. Ensinava aos médicos