Page 253 - O Poderoso Chefao - Mario Puzo_Neat
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tinha  mudado  bastante,  mas  era  ainda  indiscutivelmente  a  voz  de  Johnny  Fontane.  Tinha-se
  tornado mais rica e mais grave, como ele notara antes, mas havia também a qualidade de um
  homem cantando e não um rapaz. A voz tinha mais emoção verdadeira, mais dignidade. E a
  parte técnica do seu canto era bem superior a qualquer coisa que ele já tivesse feito.
    Era nada menos que magistral. E se estava tão boa agora, gutural como o diabo, como não
  ficaria boa quando ele estivesse em forma novamente? Johnny arreganhou os dentes para Nino e
  perguntou:
    — Está tão boa quanto eu acho?
    Nino olhou pensativamente para o seu rosto feliz.
    —  Está  extraordinariamente  boa  —  respondeu  —  Mas  vamos  ver  como  você  vai  se  sair
  amanhã.
    Johnny ficou magoado por Nino se mostrar tão pessimista.
    —  Seu  filho  da  puta,  você  sabe  que  posso  cantar  assim.  Não  se  preocupe  com  o  dia  de
  amanhã. Eu me sinto otimamente bem.
    Mas não cantou mais naquela noite. Ele e Nino levaram as garotas para uma festa, e Tina
  passou a noite na cama dele, mas Johnny não foi tão bom no amor. A garota ficou um pouco
  decepcionada. Mas que diabo, a gente não pode fazer tudo bem num só dia, pensou Johnny.
    Acordou de manhã com certa apreensão, com um vago terror de que sonhara que a sua voz
  tinha voltado. Então quando teve certeza de que não fora um sonho, receou que a sua voz sumisse
  novamente. Foi até a janela e cantarolou um pouco, depois desceu para a sala de estar ainda de
  pijama. Escolheu uma melodia no piano e depois de algum tempo tentou cantar com ela. Cantou
  abafadamente,  mas  não  havia  dor,  nem  aspereza  em  sua  garganta,  e  continuou  a  cantar.  As
  cordas eram verdadeiras e ricas, ele não precisava forçá-las absolutamente. Ela fluía fácil, fácil,
  escorria  naturalmente.  Johnny  pensou  que  os  maus  tempos  tinham  passado,  a  sua  voz  voltara
  totalmente agora. E não se incomodava nem um pouco se fracassasse com os filmes, não se
  incomodava  que  não  tivesse  conseguido  levantar  o  pau  com  Tina  na  noite  anterior,  não  se
  incomodava  que  Virginia  o  detestasse  porque  ele  era  capaz  de  cantar  novamente.  Por  um
  momento só teve uma coisa a lamentar. Se a sua voz tivesse voltado quando ele tentava cantar
  para as filhas, como teria sido formidável, Isso teria sido realmente formidável.
    A enfermeira do hotel entrara no quarto empurrando um carrinho carregado de remédios.
  Johnny levantou-se e olhou fixamente para Nino, que estava dormindo ou talvez morrendo. Sabia
  que Nino não sentia ciúme por ele ter recuperado a voz. Compreendia que Nino apenas tinha
  ciúme porque ele se sentia muito feliz por ter recuperado a voz, porque gostava imensamente de
  cantar. Pois o que era óbvio agora era que Nino não gostava bastante de coisa alguma que o
  fizesse querer continuar a viver.
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