Page 39 - O Poderoso Chefao - Mario Puzo_Neat
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Woltz curvou a cabeça em sinal de respeito ante essa referência à religião.
— Os italianos — prosseguiu Hagen — têm uma piada a respeito de que o mundo é tão duro
que um homem precisa ter dois pais para cuidar dele, e é o motivo por que eles têm padrinhos.
Como o pai de Johnny morreu, o Sr. Corleone sente a sua responsabilidade ainda mais
profundamente. Quanto a procurá-lo novamente, o Sr. Corleone é extremamente sensível. Ele
nunca pede um segundo favor quando lhe recusaram o primeiro.
Woltz deu de ombros.
— Lamento muito. A resposta continua a ser não. Mas, desde que o senhor está aqui, quanto
me custará para evitar essa complicação trabalhista? A dinheiro. Agora mesmo.
Isso resolveu um problema de Hagen. Por que Woltz estava perdendo tanto tempo com ele
quando já havia decidido não dar o papel a Johnny? E isso não podia ser mudado nessa reunião.
Woltz sentia-se seguro; não tinha medo do poder de Don Corleone. E certamente Woltz, com suas
ligações políticas nacionais, sua intimidade com o chefe do FBI, sua imensa fortuna pessoal e seu
poder absoluto na indústria cinematográfica, não se sentia ameaçado por Don Corleone. Para
qualquer homem inteligente, mesmo para Hagen, parecia que Woltz tinha avaliado corretamente
a sua situação. Ele não seria derrotado por Don Corleone, se estivesse disposto a arcar com os
prejuízos que a disputa trabalhista custaria. Havia apenas uma coisa errada nessa questão toda.
Don Corleone havia prometido ao afilhado que conseguiria o papel para ele, e Don Corleone
nunca, segundo sabia Hagen, havia deixado de cumprir a palavra em tais casos. /
— O senhor está deliberadamente interpretando mal o que eu disse — ponderou Hagen
tranqüilamente. — O senhor está procurando tornar-me cúmplice de extorsão. O Sr. Corleone
promete apenas falar em seu favor nessa complicação trabalhista como um sinal de amizade em
troca de seu empenho em favor do cliente dele. Um intercâmbio amigável de influência, nada
mais. Vejo, porém, que o senhor não me leva muito a sério. Pessoalmente, acho que isso é um
erro.
Woltz, como se estivesse esperando por tal momento, mostrou-se bastante aborrecido:
— Compreendo perfeitamente falou. — Isso é o estilo da Máfia, não é? Uma conversa toda
doce e macia quando o que realmente vocês estão fazendo é impor ameaças. Portanto, deixe-me
esclarecer a questão. Johnny Fontane jamais conseguirá esse papel, apesar de servir
perfeitamente para ele. Isso o tornará um grande astro. Mas ele nunca o será porque odeio esse
tipo imprestável, e vou expulsá-lo do cinema. Durante cinco anos mantive essa moça praticando,
cantando, dançando, representando lições, gastei centenas de milhares de dólares. Eu ia fazer
dela uma estrela. Vou ser ainda mais franco, justamente para lhe mostrar que não sou um
homem de coração duro, que não foi apenas uma questão de dinheiro. Essa moça era bonita e a
figura mais estúpida que já vi na minha vida, e eu as tive aos montes do mundo inteiro. Ela podia
dar-lhe uma descarga igual à de uma bomba-d’água. Então veio Johnny com essa sua voz oleosa
e seu encanto de carcamano e ela fugiu. Ela jogou tudo fora justamente para me tornar ridículo.
Um homem na minha posição, Sr. Hagen, não pode parecer ridículo. Tenho que despedir
Johnny.
Pela primeira vez, Woltz conseguiu impressionar Hagen. Ele achou inconcebível que um
homem com tantos recursos permitisse que tais trivialidades afetassem o seu julgamento em
questões de negócios, e um negócio de tamanha importância. No mundo de Hagen, no mundo
dos Corleone, a beleza física, o poder sexual das mulheres, não tinha o menor valor nos assuntos
materiais. Era uma questão particular, exceto naturalmente em questões de casa mento e
desgraça de família. Hagen resolveu fazer uma última tentativa.
— O senhor tem toda a razão — declarou. — Mas os seus ressentimentos são tão
importantes? Acho que o senhor não compreendeu como é fundamental para o meu cliente esse
favor tão pequeno. O Sr. Corleone segurou o Johnny em seus braços quando ele foi batizado.
Quando o pai de Johnny morreu, o Sr. Corleone assumiu os deveres da paternidade; na verdade
ele é chamado “Padrinho” por muitas e muitas pessoas que querem demonstrar seu respeito e
gratidão pelo auxílio que ele lhes deu. O Sr. Corleone nunca deixou os amigos na mão.