Page 34 - O Poderoso Chefao - Mario Puzo_Neat
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Don Corleone, com a compreensão de que estava então criando a lenda de sua grandeza,
  mostrou ao rapaz o primeiro sinal de afeição paternal, desde que ele viera para sua casa. Deu-lhe
  um rápido abraço e, daí em diante, passou a tratá-lo como um verdadeiro filho, embora às vezes
  dissesse: “Tom, nunca esqueça seus pais”, como um lembrete para si mesmo e para Hagen.
    Não era possível o rapaz esquecer. Sua mãe tinha sido quase uma débil mental abandonada e
  tão atacada de anemia que não era capaz de sentir afeição pelos filhos e nem mesmo fingir. Ao
  pai odiava. A cegueira da mãe, antes de sua morte, o aterrorizava, e a sua própria infecção no
  olho fora um gol pe do destino. Estava certo de que ficaria cego. Quando o pai morreu, aquele
  menino de 11 anos de idade seguiu um destino curioso. Vagava pelas ruas, como um animal à
  espera da morte, até o dia fatídico em que Sonny o encontrou dormindo no fundo de um vestíbulo
  e o levou para casa. O que aconteceu depois disso foi um milagre. Durante anos, Hagen tivera
  pesadelos, sonhando que tinha crescido cego, batendo com uma bengala branca, enquanto os seus
  filhos,  também  cegos,  vinham  atrás  dele  batendo  ininterruptamente  com  suas  bengalinhas
  brancas, esmolando pelas ruas. Em certas manhãs, quando despertava de seu angustiado sono, o
  rosto de Don Corleone estava estampado no seu cérebro, naquele primeiro momento consciente,
  e ele então se sentia seguro.
    Don Corleone insistiu para que ele, durante três anos, exercesse advocacia geral, além de
  suas  funções  relativas  ao  negócio  da  Família.  Essa  experiência  lhe  foi  de  grande  valor
  posteriormente,  pois  afastou  qualquer  dúvida  em  sua  mente  pelo  fato  de  trabalhar  para  Don
  Corleone. Passou dois anos pra ticando no escritório de uma grande firma de criminalistas, na
  qual Don Corleone tinha alguma influência. Era evidente para todos que o rapaz demonstrava
  inclinação para esse ramo do Direito. Saiu-se bem, e quando assumiu o serviço do negócio da
  Família, Don Corleone não teve oportunidade de reprová-lo uma vez sequer, nos seis anos que se
  seguiram.
    Quando  se  tornou consigliori  interino,  as  outras  Famílias  sicilianas  poderosas  passaram  a
  chamar  desdenhosamente  a  Família  Corleone  de  “bando  irlandês”  Isso  divertiu  Hagen.  Fê-lo
  saber também que ele jamais poderia ter esperança de suceder Don Corleone como o chefe do
  negócio da Família. Porém, se sentia contente. Nunca fora esse o seu objetivo, pois tal ambição
  séria um “desrespeito” ao seu benfeitor e aos seus parentes próximos.
    Estava ainda escuro quando o avião pousou em Los Angeles. Hagen hospedou-se no hotel,
  tomou um banho, fez a barba e viu a manhã descer sobre a cidade. Pediu que o breakfast  e
  alguns  jornais  fossem  enviados  ao  seu  quarto  e  descansou  até  a  hora  de  partir  para  a  sua
  entrevista  das  dez  horas  com  Jack  Woltz.  A  entrevista  fora  marcada  com  uma  facilidade
  surpreendente.
    Um  dia  antes,  Hagen  telefonara  para  a  pessoa  mais  poderosa  dos  sindicatos  trabalhistas
  cinematográficos, um homem chamado Billy Goff. Agindo segundo instruções de Don Corleone,
  Hagen disse a Goff para que marcasse uma hora no dia seguinte a fim de que ele visitasse Jack
  Wottz, que devia insinuar a Woltz que se ele, Hagen, não ficasse satisfeito com os resultados da
  entrevista, haveria uma greve no estúdio cinematográfico. Uma hora depois, Hagen recebeu um
  telefonema de Goff. A entrevista seria às dez da manhã. Woltz. recebe- ra o recado sobre a
  possível  greve  trabalhista,  mas  parecia  não  ter  ficado  muito  impressionado,  informou  Goff,
  acrescentando:
    — Se realmente for preciso isso, eu mesmo falarei com Don Corleone.
    — Se for preciso isso, ele falará com você — afirmou Hagen.
    Assim agindo, Hagen evitou fazer qualquer promessa. Não ficou surpreso pelo fato de Goff
  se mostrar tão solícito aos desejos de Don Corleone. O império da Família, tecnicamente, não se
  estendia além da área de Nova York, mas Don Corleone tinha primeiro se tornado forte ajudando
  os líderes trabalhistas. Muitos deles ainda tinham para com ele dívidas de amizade.
    Porém a entrevista das dez horas era um mau sinal. Significava que Hagen seria o primeiro
  da lista de entrevistas, que ele não seria convidado para almoçar. Significava que Woltz o tinha
  em pouca conta. Goff não ameaçara bastante, provavelmente porque Woltz o tinha na gaveta, o
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