Page 45 - O Poderoso Chefao - Mario Puzo_Neat
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dinheiro, com as companhias que possuía, com o poder que tinha de dar ordens. Era dez vezes
  pior do que o comunismo. Isso tinha de ser esmagado. Nunca se devia permitir tal coisa.
    Woltz acedeu em que o médico lhe aplicasse um sedativo brando. Isso o ajudou a acalmar-
  se e a pensar sensatamente. O que na realidade o chocou foi a indiferença com que esse Don
  Corleone  ordenara  matar  um  cavalo  de  fama  mundial  que  valia  seiscentos  mil  dólares.
  Seiscentos mil dólares! E isso apenas para começar. Woltz deu de ombros. Pensou na vida que
  havia conseguido organizar. Era rico. Podia possuir as mulheres mais bonitas do mundo acenando
  com o dedo e prometendo um contrato. Era recebido por reis e rainhas. Levava a vida mais
  confortável que o dinheiro e o poder eram capazes de proporcionar. Era loucura arriscar perder
  tudo isso por causa de um capricho. Talvez pudesse chegar a um acordo com Don Corleone.
  Qual  é  a  punição  legal  pelo  ato  de  se  matar  um  cavalo  de  corrida?  Ele  riu  selvagemente,
  enquanto o seu médico e os criados o observavam com nervosa preocupação. Outro pensamento
  ocorreu-lhe.  Ele  seria  motivo  de  chacota  de  toda  a  Califórnia  simplesmente  porque  alguém
  desafiara desdenhosamente o seu poder de maneira tão arrogante. Isso o levou a decidir-se. Isso
  e o pensamento de que, talvez, talvez eles não o matassem. Que estivesse planejando algo mais
  astuto e mais doloroso.
    Woltz  deu  as  ordens  necessárias.  A  sua  equipe  pessoal  de  confiança  entrou  em  ação.  Os
  criados e o médico juraram manter segredo sob pena de expor-se à inimizade imorredoura de
  Woltz e do estúdio. Comunicou-se à imprensa que o cavalo de corrida Khartoum tinha morrido
  de uma doença contraída durante o seu embarque na Inglaterra. Foram expedidas ordens para
  enterrar os restos mortais do animal num lugar secreto da propriedade.
    Seis horas depois, Johnny Fontane recebeu um telefonema do produtor-executivo do filme
  informando-o de que se apresentasse para trabalhar na segunda-feira seguinte.
    Nessa  noite,  Hagen  dirigiu-se  à  casa  de  Don  Corleone  a  fim  de  preparar-se  para  a
  importante  reunião  que  manteria  no  dia  seguinte  com  Virgil  Sollozzo.  Don  Corleone  havia
  chamado  o  filho  mais  velho  para  comparecer,  e  Sonny  Corleone,  com  seu  rosto  de  cupido
  denunciando  cansaço,  estava  bebendo  calmamente  um  copo  de  água.  Ele  ainda  devia  estar
  trepando com aquela dama de honra, pensou Hagen. Outra preocupação.
    Don Corleone instalou-se numa poltrona fumando o seu charuto Di No bili. Hagen tinha uma
  caixa deles em sua sala. Ele havia tentado fazer Don Corleone mudar para o Havana, mas o Don
  alegara que este lhe irritava a garganta.
    — Será que sabemos tudo necessário a respeito? — perguntou Don Corleone.
    Hagen abriu o arquivo onde se encontravam as suas notas. Tais notas não eram de forma
  alguma incriminatórias, mas simplesmente lembretes enigmáticos para assegurar que ele estava
  de posse de todos os detalhes importantes.
    — Sollozzo vem nos solicitar ajuda — disse Hagen. — Vai pedir á Família que levante pelo
  menos um milhão de dólares e prometa alguma espécie de imunidade com respeito à lei. Em
  virtude disso, passamos a participar da operação, ninguém sabe quanto. Sollozzo é garantido pela
  Família  Tattaglia  que,  em  conseqüência,  participa  da  operação.  A  operação  são  narcóticos.
  Sollozzo tem os seus agentes na Turquia, onde cultivam a papoula. Daí ele a embarca para a
  Sicília.  Nenhuma  dificuldade.  Na  Sicília,  transforma  a  planta  em  heroína.  Tem  operações
  seguras para transformá-la em morfina e voltar a transformá-la em heroína, se for necessário.
  Mas  parece  que  a  fabricação  do  produto  na  Sicília  é  protegida  de  toda  maneira.  A  única
  dificuldade é trazê-la para os Estados Unidos e depois proceder à distribuição. Outra, o capital
  inicial. Um milhão de dólares em dinheiro não nasce em árvores.
    Hagen  viu  Don  Corleone  fazer  uma  careta  de  desaprovação.  O  velho  de  testava  floreios
  desnecessários em questão de negócio. Continuou a falar de modo rápido:
    — Chamam Sollozzo de turco por dois motivos. Ele passou algum tempo na Turquia e supõe-
  se que tem uma mulher e filhos turcos. Segundo, pensa-se que ele é muito ligeiro com a faca, ou
  era, quando jovem. Somente em questões de negócio, entretanto, e com uma espécie de queixa
  razoável.  Ë  um  homem  muito  competente,  sendo  seu  próprio  chefe.  Tem  ficha  na  polícia,
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