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status da sociedade soteropolitana. O número de libertos   carregar cadeiras, trabalhar em alvarengas, os libertos
                           crescia. A Sé não era uma das freguesias com maior   pagavam impostos suplementares à municipalidade.
                           agrupamento  de  negros  ou  de  escravos,  ficava  atrás   Segundo dados de Nascimento (1986), na Sé, em
                           das freguesias do Pilar, Passo e São Pedro. Isso pode se   1847, havia 356 pessoas libertas, perfazendo 14,2%
                           explicar pelo fato de haver nas freguesias centrais, desde   da totalidade dessa população na cidade. Esses eram,
                           o  início  do  século  –  período  de  intensa  ação  rebelde   na sua maioria, os moradores das lojas, muitas vezes
                           escrava –, constante fiscalização e repressão às “reuniões   compondo grupos de solteiros, sem família, unidos pela
                           de pretos”, proibidas pelas posturas municipais, o que   etnia comum, se africanos, ou talvez pela profissão. Tais
                           tirava dessa população a “liberdade” de divertimento e   aglomerados deviam ser o fermento social da cidade, de
                           manifestação religiosa nessas freguesias.       onde surgiam as lutas por melhores condições de vida,
                                                                           as inconformidades, as revoltas.
                           A  preocupação  com  os  libertos  era  grande  e
                           expressava-se em leis que visavam principalmente   A Sé concentrava o maior número de pessoas que viviam
               Escravos    impedir a indigência e “vagabundagem” dessas pessoas   sós ou com escravos. As que moravam com um escravo,
              de ganho:    consideradas perigosas. O liberto não tinha direito,   provavelmente de ganho, não podem ser confundidas
            carregadores
          (Sampaio, 2005,   por exemplo, de alugar casas, a menos que obtivesse   com a população abastada que outrora ocupou essa
                p. 128).   uma autorização especial do juiz de paz. Para mercar,   freguesia. Em geral tratava-se de pessoa humilde,
                                                                           possivelmente  liberta, e  o  ganho  do  trabalho  desse
                                                                           escravo talvez fosse sua única fonte de renda. Os que
                                                                           viviam sós podiam ser os próprios escravos de ganho.
                                                                           Analisando as profissões declaradas pelos moradores da
                                                                           Sé no censo de 1855, Nascimento (1986) verificou que
                                                                           eram em sua maioria ganhadores, alfaiates, barbeiros,
                                                                           ferreiros, sapateiros, corretores, cortadores de carne,
                                                                           cozinheiros, advogados, lojistas, marceneiros, funileiros,
                                                                           ourives, pintores, empregados públicos, padres,
                                                                           caixeiros e, entre as mulheres, costureiras, ganhadeiras,
                                                                           negociantes  e  quitandeiras,  ocupações  próprias  de
                                                                           escravos e libertos.

                                                                           Ao lado de pessoas solitárias, havia famílias extensas que
                                                                           dividiam o mesmo espaço. A pesquisa de Nascimento
                                                                           (1986) encontrou um número médio de 8,6 moradores
                                                                           por fogo, compondo o cotidiano daquela freguesia. Em
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                                                                           abrigava 50 pessoas, que não conseguiam, segundo





                                                                                              ArqueologiA no Pelourinho
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