Page 48 - TUTELA DE URGÊNCIA E TUTELA DA EVIDÊNCIA, Luiz Guilherme Marinoni, Ed. RT, 2017
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o  arresto  e  o  sequestro  não  constituem  tutela  preventiva,  mas  sim  tutela  de  segurança  da  tutela
                  repressiva.

                     Confirma-se,  assim,  o  que  antes  foi  dito:  o  arresto  admite  a  ocorrência  do  dano,  cingindo-se  a
                  assegurar  a  concretização  da  tutela  ressarcitória.  Esta  tutela  cautelar  aceita  a  violação  do  direito,
                  tendo  o  fim  de  assegurar  a  efetividade  da  tutela  repressiva.  Frise-se  que  a  tutela  cautelar,  ao  ser
                  concebida,  e,  inclusive,  incorporar  a  figura  do  arresto,  certamente  não  podia  abranger  a  inibitória,
                  pois é ilógico conceber uma tutela preventiva como instrumento de um processo repressivo. É absurdo
                  imaginar  que,  em  um  sistema  que  trabalhava  com  sentenças  (declaratória,  constitutiva  e
                  condenatória) que não viabilizavam tutela preventiva, a tutela cautelar pudesse ir além da sua função
                  de segurança do processo, extrapolando dos seus limites para dar tutela preventiva ao direito material
                  e, assim, eliminar a própria característica de instrumentalidade que lhe foi conferida. 85

                     A tutela cautelar passou a ser admitida como tutela preventiva quando a prática forense percebeu
                  que as novas situações de direito material necessitavam de uma tutela capaz de impedir o ilícito. A
                  transformação da tutela de segurança em tutela preventiva fez com que se percebesse que essa tutela,
                  por  ser  uma  tutela  não  caracterizada  pela  instrumentalidade,  não  necessitava  de  duas  ações
                  processuais,  ou  de  uma  ação  principal  seguindo  a  ação  que  passou  a  ser  rotulada  de  cautelar.  Na
                  verdade,  o  fenômeno  da  distorção  da  ação  cautelar  é  apenas  a  mostra  sensível  de  que  o  veículo
                  processual idealizado para a tutela cautelar (dotado de liminar e sentença mandamental) passou a ser
                  utilizado  para  a  obtenção  da  tutela  inibitória  (tutela  preventiva).  Porém,  como  a  tutela  inibitória
                  impede  a  violação,  satisfazendo  o  desejo  de  tutela  jurisdicional,  é  claro  que  a  ação  que  a  veicula
                  apenas pode ser autônoma, dispensando qualquer ação principal. Melhor explicando: a prática não
                  apenas admitiu a busca de tutela inibitória a partir de ação rotulada de cautelar – em virtude das suas
                  particularidades, desenhadas para atender a uma situação de urgência –, mas foi além, aceitando a
                  transformação do próprio procedimento cautelar para atender à natureza desta tutela de direito.
                     Atualmente,  quem  deseja  obter  tutela  capaz  de  impedir  a  violação  de  direito  deve  propor  ação
                  inibitória,  construída  com  base  nas  técnicas  processuais  presentes  no  art.  536,  do  CPC;  nunca  ação
                  baseada no art. 305 do Código de Processo Civil, que, por exigir a formulação de “pedido principal”
                  (art.  308,  CPC),  obviamente  não  se  presta  à  obtenção  de  tutela  inibitória  ou  de  qualquer  tutela
                  satisfativa do direito material.

                     3.4. Tutela de remoção do ilícito e tutela cautelar

                     A tutela de remoção do ilícito objetiva eliminar os efeitos concretos posteriores à prática da ação
                  ilícita,  nada  tendo  a  ver  com  dano  ou  com  a  sua  probabilidade.  Não  obstante,  em  virtude  da  não
                  percepção da distinção entre ilícito e dano ou da não compreensão da necessidade de uma tutela civil
                  dirigida unicamente contra o ilícito, a prática forense não conseguiu admitir outra coisa além de uma
                  tutela voltada contra a probabilidade do dano. Assim, por exemplo, no caso de exposição à venda de
                  produto com composição proibida, afirmava-se a probabilidade do dano à saúde do consumidor para
                  se requerer tutela cautelar.
                     Ou  seja,  como  a  doutrina  brasileira  jamais  pensou  em  uma  tutela  voltada  a  remover  o  ilícito,
                  imaginou-se que a sua natureza fosse cautelar. Porém, isso é consequência da falta de distinção entre
                  o ilícito e a sua consequência eventual, que é o dano. Como a tutela de remoção do ilícito, por mera
                  consequência, impede a produção do dano, confundiu-se tutela contra o ilícito já praticado (remoção
                  do ilícito) e tutela contra a probabilidade do dano.

                     Note-se que a busca e apreensão de produto com composição ilícita constitui técnica processual de
                  remoção  do  ilícito,  que  satisfaz  por  si  mesma.  Se  a  busca  e  apreensão,  ao  remover  o  ilícito,  acaba
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