Page 49 - TUTELA DE URGÊNCIA E TUTELA DA EVIDÊNCIA, Luiz Guilherme Marinoni, Ed. RT, 2017
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colaborando com a prevenção do dano, a verdade é que o seu fundamento não está na probabilidade
                  do  dano,  mas  na  prática  do  ilícito.  De  modo  que  o  autor,  em  tal  ação  (de  remoção  do  ilícito),  deve
                  afirmar a prática de um ilícito de eficácia continuada e não simplesmente a probabilidade de dano.

                     Realmente, o mais grave é que se admitia, nestas situações, a discussão do dano, exigindo-se do juiz
                  a formação de convicção acerca da probabilidade do dano para a concessão da tutela jurisdicional.
                  Porém, quando se toma consciência da imprescindibilidade da tutela civil contra o ilícito, fica fácil ver
                  que,  para  a  sua  obtenção,  basta  afirmar  e  demonstrar  a  ocorrência  de  um  ato  contrário  ao  direito
                  cujos efeitos concretos se prolongam no tempo, constituindo uma fonte aberta à produção de danos.

                     Além  disto,  como  a  tutela  de  remoção  do  ilícito  é  satisfativa,  não  se  revestindo  da
                  instrumentalidade característica à tutela cautelar, não há como imaginar, neste caso, a necessidade de
                  um “pedido principal”. A tutela de remoção deve ser buscada através de ação estruturada com base
                  nas  técnicas  do  art.  536  do  Código  de  Processo  Civil.  Portanto,  de  ação  com  procedimento  comum
                  dotada de técnicas processuais idôneas à obtenção de tutela específica, gênero em que está inserida a
                  tutela de remoção do ilícito, assim como a tutela inibitória.

                     Como está claro, a ação do art. 305 não é adequada para a prestação da tutela de remoção do ilícito.
                  Essa  tutela,  assim  com  a  inibitória,  não  pode  ser  considerada  instrumento  de  nenhuma  das  tutelas
                  satisfativas do direito material, como a ressarcitória. As tutelas inibitória e de remoção do ilícito não
                  se caracterizam pela instrumentalidade, não sendo marcadas pela referibilidade a uma outra tutela.


                  4. Da tutela antecipada

                     4.1. Tutela antecipada ou tutela do direito mediante cognição sumária

                     Não é preciso lembrar que os pressupostos da regra da nulla executio não têm mais valor algum na
                  atualidade e que há muito tempo, em vista de concretas exigências de tutela jurisdicional, a execução
                  passou  a  anteceder  a  declaração.  Assim,  não  há  mais  motivo  para  pensar  que  a  providência
                  jurisdicional concedida no curso do processo de conhecimento não tem conteúdo jurídico, mas apenas
                  fático, como supunha a doutrina que enxergava na tutela cautelar uma simples “sistematização de fato
                  da controvérsia” ou mesmo a doutrina perfilhada por Fritz Baur,  que via na satisfação do interesse
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                  do  requerente  da  ordem  judicial  de  prestação  (medida  provisória)  uma  mera  satisfação  fática.  Na
                  verdade,  a  ideia  que  foi  vulgarizada  na  ciência  processual,  no  sentido  de  que  a  tutela  de  cognição
                  sumária  não  poderia  conferir  satisfação  diversa  da  “meramente fática”,  possui  profundas  raízes  na
                  tese chiovendiana de ação cautelar como “mera ação”. Ora, para a atribuição da qualidade “jurídica”
                  aos efeitos produzidos pela tutela jurisdicional pouco importa o fato de que esta supõe a existência de
                  um direito que pode ser negado ao final.
                     Aliás,  é  interessante  lembrar  a  insistência,  que  possui  fundamento  chiovendiano  e  mesmo  pós-
                  chiovendiano, no sentido de que só há jurisdição onde há provimento capaz de produzir coisa julgada
                  material. A ideia de ligar jurisdição a coisa julgada material desapareceu em vista das novas e recentes
                  exigências de tutela jurisdicional, que não podiam esperar o tempo para a declaração relevante – que
                  somente pode ser produzida pela cognição exauriente.  Não é apenas a qualidade da coisa julgada
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                  material  que  dá  conteúdo  jurídico  a  um  provimento,  nem  é  somente  a  tutela  marcada  pela  coisa
                  julgada  material  que  incide  sobre  as  relações  substanciais.  A  tutela  satisfativa  de  cognição  sumária
                  realiza o direito material afirmado pelo autor ou, em outras palavras, dá satisfação ao direito material
                  afirmado, obviamente incidindo – ainda que, na angulação processual, de forma provisória – sobre o
                  plano  das  relações  substanciais.  A  realização  de  um  direito  mediante  a  técnica  antecipatória  é
                  realização de um direito que preexiste à sentença de cognição exauriente.
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