Page 50 - TUTELA DE URGÊNCIA E TUTELA DA EVIDÊNCIA, Luiz Guilherme Marinoni, Ed. RT, 2017
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A técnica antecipatória produz a tutela material ou o efeito jurídico que, a princípio, viria apenas ao
final. Um efeito que, por óbvio, não descende de uma eficácia que tem a mesma qualidade da eficácia
da sentença. A técnica antecipatória permite que sejam realizadas antecipadamente as consequências
concretas da sentença de mérito. Estas consequências podem ser identificadas com os efeitos externos
da sentença, ou seja, com aqueles efeitos que operam fora do processo e no âmbito das relações de
direito material. 88
Não há mais como admitir que a tutela que satisfaz o direito com base em cognição sumária –
antecipadamente – possa continuar a ser equivocadamente designada de cautelar. Isso acontecia numa
época em que, em vista da regra da nulla executio sine titulo, não se admitia realização do direito no
curso do processo. Hoje, especialmente diante do teor do código de 2015, não há mais motivo algum
para continuar a falsear a natureza da tutela satisfativa do direito prestada com base em cognição
sumária. Trata-se exatamente da tutela que é desejada pelo autor e que, assim, pode ser prestada no
curso do processo com base em cognição sumária ou ao final com base em cognição exauriente. Bem
por isso, tutela satisfativa sumária é sinônimo de tutela antecipada.
4.2. Tutela antecipada declaratória e constitutiva?
Quando se fala em tutela satisfativa mediante cognição sumária ou em tutela antecipada é fácil
perceber que todas as tutelas de direito implementadas por sentenças que dependem de execução
podem ser antecipadas ou prestadas mediante cognição sumária. O problema é saber se as tutelas
declaratória e (des)constitutiva, prestadas por sentenças autossatisfativas ou que desnecessitam de
execução, podem ser prestadas mediante cognição sumária ou antecipadas.
Ferruccio Tommaseo, ao tratar de questão que diz respeito à possibilidade da antecipação do efeito
declaratório para atribuir ao autor o bem jurídico da certeza, afirma que há uma intrínseca
inidoneidade da cognição sumária para permitir ao juiz antecipar a certeza a respeito das relações
jurídicas – em que se reduz o bem jurídico outorgado pela sentença declaratória. Porém, Tommaseo
sustenta que uma “declaração sumária” pode ser útil ao autor da ação declaratória para determinar o
seu comportamento em face de algumas situações de direito substancial. Assim, por exemplo, a tutela
requerida pelo empregador que declara antecipada e sumariamente a legitimidade da despedida de
um empregado. 89
Gianpiero Samori, em ensaio intitulado “La tutela cautelare dichiarativa”, publicado na Rivista
Trimestrale di Diritto e Procedura Civile, advertiu que não seria possível nem mesmo uma “declaração
sumária”, nos moldes preconizados por Tommaseo. Segundo Samorì, tal tipo de tutela não teria
utilidade prática alguma. Para esse autor, a tutela sumária declaratória não é justificada na
perspectiva funcional em vista da inidoneidade da decisão para garantir uma concreta utilidade ao
autor, que não pode pretender utilizá-la como fonte de legitimação de um comportamento.
É certamente impossível a antecipação da eficácia declaratória ou conceder antecipadamente ao
autor o bem da “certeza jurídica”, o qual somente é capaz de ser atribuído pela sentença declaratória.
A cognição inerente ao juízo antecipatório é por natureza imprestável para atribuir ao autor a
“declaração” ou a “certeza jurídica”. Aliás, a sentença impugnada mediante recurso igualmente não é
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bastante para eliminar a incerteza jurídica; só a sentença declaratória atrelada à coisa julgada
material presta a tutela (declaratória) que põe fim ao estado de incerteza, definindo a existência, a
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inexistência ou o modo de ser de uma relação jurídica.
Nem mesmo a declaração sumária tem alguma utilidade, a despeito da posição de Tommaseo. No
exemplo apresentado pelo processualista italiano, de “declaração sumária” da legitimidade da
despedida de um empregado, não se confere qualquer efeito útil ao autor. Ora, a declaração sumária