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Logo no primeiro fim de semana, resolvi ir até uma casa noturna GLS. Era 4 de agosto de
        2006. Recordo a data porque até hoje mantenho o fôlder (propaganda da casa). Esse fôlder

        é como se fosse a minha Lei Áurea. Representa a minha liberdade.
          Minha noite foi tragicômica. Hoje dou muita risada ao lembrar. Eu era um gay ‘não gay’.
        Logo, fui com uma roupa inadequada, social demais. Não conhecia nenhuma música, afinal

        vivia ouvindo rock e nem imaginava quem era Britney Spears. Não consegui disfarçar minha
        surpresa ao ver todas aquelas pessoas descoladas e felizes, de mãos dadas. Era como se

        aquelas mãos dadas me hipnotizassem, era absolutamente sensacional cada flagra de beijo.
        Os transexuais, travestis e drag queens me assustavam, era como se tivesse que manter
        distância. Afinal, até aquele dia, era isso que a vida tinha me ensinado.

          Cheguei  bem  tarde,  depois  de  ter  dado  várias  voltas  no  quarteirão,  por  medo  de  ser
        identificado nas proximidades daquele ambiente. No lounge, sozinho, atento aos diálogos

        alheios, me impressionava o caos relativo ao gênero: ‘amiga’, ‘bicha’. Minha primeira visita
        ao  banheiro  foi  hilária.  Entrei  e  saí  correndo.  Era  um  misto  de  medo,  tesão,  tensão,
        apreensão e uma felicidade doida. Nem imagino o que as pessoas pensavam daquele cara

        que passou a noite inteira sentado numa cadeira do balcão, atento a tudo, surpreso e com
        um sorriso estampado no rosto. Quando se aproximavam de mim ou percebia um flerte, eu

        me  esquivava  e  de  certa  forma  corria.  Lembro  que  naquele  dia  nem  dormi  direito
        relembrando cada momento.
          Na noite seguinte, não resisti e voltei à mesma casa noturna. Nessa segunda noite, mantive

        um diálogo com o bartender. Talvez, pela ansiedade, tenha bebido muito e isso tenha feito
        com que baixasse a guarda e permitisse que as pessoas se aproximassem. Fiquei até muito

        tarde. O bartender veio, então, conversar comigo. Não lembro ao certo, mas acho que falei
        muita besteira. Eu suava frio, tremia. Acho que, percebendo meu estado alcoólico, e depois
        de saber que aquela era a minha segunda noite num ambiente gay, ele arriscou um beijo.

        Cinco de agosto de 2006: aos 22 anos, eu fui beijado pela primeira vez por um homem.
          Aquilo foi muito para mim. Afastei-o, não me despedi e saí o mais rápido que pude daquele

        lugar. Senti repulsa pelo meu corpo, senti nojo de mim. É estranho, mas foram sensações
        completamente antagônicas, uma oposição entre o meu desejo e o que a sociedade me
        imprimiu. Ao mesmo tempo que era prazeroso, eu sentia rejeição pelo fato de estar beijando

        um homem. Apesar de ser meu maior desejo, era algo que eu tinha aprendido ser inaceitável.
          Em casa, escovei os dentes diversas vezes. Como se aquilo pudesse apagar meu ato, como
        se fosse possível redimir o meu ato. Por quê? Porque eu fui ensinado assim. Porque fui criado

        num berço católico no qual minha recente atitude era pecado. Eu era uma aberração.
          Como filho único, eu também sentia vergonha por ser uma decepção muito grande para a

        minha mãe, que sempre teve a expectativa de netos. Naquela manhã, eu era o maior lixo do
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