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vingança é que me parece surpreendente. O que poderíamos estar nos perguntando, neste
momento, é: como a gente faz para alertar um juiz por “abandono da razão”?
Há duas fotos de Luciane publicadas na Folha de S.Paulo: uma segurando um retrato dela
quando bebê, no colo da mãe; a outra vestida de caipira na escola. São fotos comoventes e
também são fotos escolhidas para comover — o que me faz ficar ainda mais aflita por ela. As
duas fotos, assim como seu discurso, parecem dizer: “Pai, veja como sou ‘amável’”. Ou:
“Brasil, veja como sou ‘amável’. Por que esse homem mau não quis me amar?”. Parece que
é isso que Luciane foi buscar na Justiça: a comprovação, pelo Estado, de que ela é ‘amável’,
o pai é que falha. E assim ela continua, tristemente, tentando chamar a atenção do pai.
O problema é que dificilmente Luciane conseguirá seguir adiante, paralisada como parece
estar no mesmo lugar simbólico. E mais difícil será agora que o tribunal a acompanha na
ilusão de que é possível obrigar um pai a ser pai. Ou obrigar um pai a amá-la. E não há dúvida
de que ela sofre muito com tudo isso. Tornar-se adulto, porém, é descobrir que o baralho
nunca estará completo, que nem mesmo existe um baralho completo. Temos de jogar com
as cartas que temos. E tentar recuperar cartas que jamais existiram, como se elas estivessem
apenas perdidas, não nos ajuda a viver melhor. Apenas nos congela em um lugar infantil.
É um caso fascinante pelo que revela sobre o nosso tempo. E há bem mais ainda para se
ver nele. Por enquanto, queria lembrar ainda que, às vezes, o melhor que pode acontecer a
um filho é que certos pais e mães fiquem bem longe.
07 de maio de 2012