Page 230 - As Crônicas de Nárnia - Volume Único
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O fauno entrou, meio dançando, com uma bandeja quase do tamanho
                  dele.  Depositou-a  numa  mesinha  ao  lado  do  divã,  sentando-se  no  chão
                  atapetado com as pernas de bode cruzadas.

                        - Agora, coma direitinho. Será a sua última refeição em Tashbaan.

                        Era uma boa comida à maneira calormana. Não sei se você teria ou
                  não gostado, mas Shasta gostou. Havia lagosta, salada, uma ave chamada
                  narceja toda recheada de amêndoas e trufas, e um prato muito complicado
                  feito de fígado de galinha, arroz, passas, nozes, além de melão cru, frutas
                  silvestres  e  tudo  de  bom  que  se pode  fazer  com  o  gelo.  E  havia  até um
                  pouquinho  do  vinho  que  se  chama  “branco”,  apesar  de  ser  de  fato
                  amarelado.

                        O  fauno  gentil,  pensando  que  Shasta  ainda  sentia  os  efeitos  da
                  insolação, passou a falar sobre as aventuras que os esperavam nas terras do
                  Norte; sobre o seu velho pai, o rei Luna de Arquelândia, que morava num
                  pequeno castelo sobre as colinas do Sul.
                        -  Você  sabe  que  lhe  prometeram  a  primeira  armadura  e  o  primeiro
                  cavalo de guerra para o seu próximo aniversário. Terá de aprender a lutar
                  em torneio e manejar a lança. Se sair-se bem, em pouco tempo será feito
                  Cavaleiro  de  Armas,  em  Cair  Paravel,  conforme  prometeu  a  seu  pai  o
                  próprio  rei  Pedro.  Antes  disso  é  pensar nas idas e vindas  entre  Nárnia e
                  Arquelândia, passando pelas grimpas das cordilheiras. Não vá esquecer que
                  prometeu  passar  comigo  toda  a  semana  do  Festival  de  Verão...  com
                  fogueiras  e  faunos  e  dríades  dançando  até  nascer  o  sol,  lá  no  meio  da
                  floresta e... quem sabe?... Quem sabe a gente possa ver o próprio Aslam?!

                        Terminada  a  refeição,  o  fauno  recomendou  a  Shasta  que  ficasse
                  quietinho:

                        - Uma soneca lhe fará bem. Virei buscá-lo com tempo de sobra para
                  embarcar. E aí, Nárnia! Norte!

                        Shasta gostou tanto do jantar e das delícias contadas por Tumnus que,
                  ao  ficar  sozinho,  seus  pensamentos  já  não  eram  bem  os  mesmos.  Sua
                  grande esperança agora era que o príncipe Corin chegasse tarde demais, e
                  que ele assim fosse de navio para Nárnia. Sinto dizer que ele não pensava
                  no que poderia acontecer ao verdadeiro Corin, perdido em Tashbaan. Só
                  estava  um  pouquinho  preocupado  com  Aravis  e  Bri  esperando-o  nas
                  tumbas. “Mas que posso fazer? Já que Aravis pensa que está muito acima
                  de mim, pode muito bem ir sozinha.” E achou que, afinal de contas, era
                  muito melhor ir até Nárnia de navio do que capengando pelo deserto.

                        Então  aconteceu  o  inevitável:  qualquer  um,  depois  de  ter  acordado
                  muito  cedo  e  enfrentado  uma  longa  caminhada  e  muitas  emoções,  ao  se
                  deitar  num  divã,  sem  calor,  sem  o  menor  barulho,  a  não  ser  o  de  uma
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