Page 234 - As Crônicas de Nárnia - Volume Único
P. 234

Eram  cerca  de  doze  túmulos,  cada  um  com  uma  entrada  arqueada
                  dando  para  as  trevas.  Não  havia  nenhuma  ordem  na  sua  distribuição,  e
                  assim levava tempo para se dar a volta em todos. Foi o que Shasta teve de
                  fazer. Não encontrou ninguém.

                        Havia  um  grande  silêncio  ali,  nas  portas  do  deserto.  E  o  sol
                  desapareceu.

                        De  repente, de  trás do  menino,  chegou um  ruído  assustador.  Shasta
                  teve de morder a língua para não dar um berro. Percebeu do que se tratava:
                  eram as trombetas de Tashbaan comandando o fechamento dos portões.

                        - “Não banque o covarde” - falou Shasta para si mesmo. - “É o mesmo
                  barulho que ouvi hoje de manhã.”
                        Mas não era o mesmo: um barulho ouvido de manhã, entre amigos, é
                  uma coisa, e um barulho ouvido sozinho, à noite, é outra. Agora, que os
                  portões se fechavam, os amigos não poderiam mais encontrar-se com ele.
                  “Ou ficaram presos em Tashbaan ou partiram sem mim. Deve ter sido idéia
                  de Aravis. Bri não faria isso nunca. Será que faria?”

                        Mais uma vez, Shasta estava errado a respeito de Aravis. Esta podia
                  ser orgulhosa e bastante áspera, mas era de uma lealdade de ferro e jamais
                  teria abandonado um companheiro, gostasse dele ou não.

                        Agora  que  tinha  de  passar  a  noite  sozinho,  à  medida  que  ia
                  escurecendo gostava ainda menos do lugar. Algo muito inquietante pairava
                  sobre  aquelas  silenciosas  formas  de  pedra.  Já  conseguira  de  si  mesmo  o
                  máximo para não pensar em morcegos, mas não agüentava mais.

                        - Ai! Ai! Socorro! - berrou de repente, ao sentir que algo tocava na sua
                  perna.  (Não  condeno  ninguém  por  berrar  nas  mesmas  circunstâncias.)
                  Shasta estava tão amedrontado que nem podia correr. Qualquer coisa, aliás,
                  seria melhor do que ser caçado pelo cemitério dos Antigos Reis por algo
                  que  ele  nem  tinha  coragem  de  olhar.  Fez  então  o  que  de  mais  sensato
                  poderia fazer. Deu uma espiada e quase explodiu de tanto alívio.

                        Era um gato.
                        A noite já estava muito escura para ter uma idéia completa daquele
                  gato:  viu  só  que  era  um  gatão  muito  solene.  Estava  ali  como  se  tivesse
                  passado  anos  entre  os  túmulos,  sozinho.  Seus  olhos  pareciam  encerrar
                  grandes segredos.

                        -     Bichano,       bichano...      Não       vai      me      dizer      que
                  você também é um gato falante...

                        O gato olhou para ele com dureza e começou a caminhar, seguido por
                  Shasta,  naturalmente.  Andaram  para  os  lados  do  deserto.  Depois  o  gato
                  sentou-se com o rabo enrolado, virado para o deserto, para Nárnia, para o
   229   230   231   232   233   234   235   236   237   238   239