Page 240 - As Crônicas de Nárnia - Volume Único
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- Ah, perdão, querida, já havia me esquecido. Todos aqui! O porteiro
também. Ninguém hoje tem licença de botar o pé fora de casa. E, se ouvir
alguém falando qualquer coisa a respeito desta moça, será espancado até
cair morto, ou queimado vivo, ou então ficará a pão e água por seis
semanas. É tudo.
Embora Lasaralina dissesse que estava louca para ouvir a história de
Aravis, não mostrou o menor sinal disso. Evidentemente, gostava muito
mais de falar que de ouvir. Insistiu para que Aravis tomasse um banho
suntuoso (os banhos calormanos são famosos) e depois deu-lhe lindas
roupas para vestir. O alvoroço que fez na hora de escolher as roupas quase
estourou a cabeça de Aravis. Lasaralina era a mesma, interessada apenas
em roupas, festas e intriguinhas, enquanto ela, Aravis, sempre preferia
arcos e flechas, cães e cavalos, e natação. Cada uma devia achar a outra
uma boba.
Depois de uma refeição, dessas de cremes, geléias e frutas, feita numa
sala cercada de colunas, e que Aravis teria apreciado melhor sem o
macaquinho travesso da amiga, Lasaralina perguntou afinal pela história. E,
depois de ouvi-la, falou:
- Mas, minha querida, por que você não se casa com Achosta Tarcaã?
São todas doidas por ele. Meu marido sempre diz que Achosta está ficando
um dos grandes homens deste país. Ainda há pouco foi feito grão-vizir,
depois que morreu o velho Axarta. Vai dizer que não sabia?
- Isso não me interessa. Não agüento nem a cara dele.
- Mas pense uma coisa, querida! Três palácios! Um deles é aquele
maravilhoso que dá para o lago de Ilkin. E uma fábula em pérolas, já me
contaram. Banhos de leite de jumenta. E a gente ia se ver tantas vezes!
- Ele pode fazer o que quiser com os palácios e as jumentas dele;
pouco me interessa.
- Você sempre foi muito estranha, Aravis. Que mais pretende na vida?
Aravis acabou conseguindo que a amiga acreditasse que ela não estava
brincando. E puderam então discutir planos sérios. Não seria difícil levar os
cavalos pelo portão do norte até os túmulos. Ninguém interromperia um
escudeiro bem vestido conduzindo um cavalo selado até o rio. O problema
era saber o que fazer com a própria Aravis. Sugeriu ser conduzida de liteira
com as cortinas abaixadas. Impossível: as liteiras só eram usadas dentro da
cidade; se uma transpusesse os portões, causaria suspeitas.
Conversaram por um tempo interminável, pois era difícil segurar
Lasaralina dentro do assunto. Por fim a amiga bateu palmas de
contentamento: