Page 245 - As Crônicas de Nárnia - Volume Único
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                                                                NA CASA DO TISROC





                        O jovem tomou a palavra:

                        -  Pai-meu-e-deleite-dos-meus-olhos!  -  falava  depressa  e  num  tom
                  emburrado sem convencer a ninguém que o Tisroc fosse o deleite de seus
                  olhos.  -  Louvado  seja  o  seu  nome  para  sempre!  O  senhor  me  destruiu
                  completamente. Se tivesse me dado a mais rápida de suas galeras ao nascer
                  do  sol,  quando  percebi  que  o  navio  dos  malditos  bárbaros  se  afastava,
                  talvez eu os tivesse alcançado. Persuadiu-me porém o senhor a verificar se
                  acaso  não  estariam  eles  buscando  melhor  ancoradouro.  Perdemos  todo  o
                  dia. E já se foram... já se puseram fora do meu alcance! Aquela falsa jóia,
                  aquela...

                        E aqui o jovem começou a referir-se à rainha Susana com palavras que
                  não fica bem registrar no papel. Pois, sem dúvida, tratava-se do príncipe
                  Rabadash; a falsa jóia só podia ser Susana de Nárnia.

                        - Olha a compostura, filho meu - disse o Tisroc. - A partida de um
                  hóspede faz uma ferida que se cura mais depressa no coração do sensato.

                        - Mas eu quero a moça - bradou o príncipe. - Eu preciso da moça! Vou
                  morrer sem... sem aquela falsa, soberba, aquela traiçoeira filha de um cão
                  sarnento! Já não posso mais dormir, o melhor alimento não me apetece, os
                  meus olhos estão ofuscados pela beleza daquela bárbara. Preciso da rainha
                  bárbara.
                        - Como disse tão bem o divino poeta - observou o vizir, erguendo o
                  rosto um tanto empoeirado -, “uns bons goles na fonte da razão ajudam a
                  apagar o fogo do coração”.

                        Esse verso irritou ainda mais o príncipe.

                        - Seu cachorro! - gritou ele, aplicando chutes certeiros no traseiro do
                  grão-vizir. - Não ouse levantar poetas contra mim. Estou cheio de versos e
                  máximas!

                        É possível que Aravis não tenha sentido a menor pena do vizir.
                        O  Tisroc  parecia  mergulhado  em  devaneios,  mas,  ao  notar  o  que
                  acontecia, falou tranqüilamente:

                        - Filho  meu,  pare  de  dar  pontapés  no  venerável  e  esclarecido  vizir:
                  pois, assim como uma gema conserva o seu valor mesmo num monte de
                  estéreo, deve a velhice ser respeitada, mesmo na mais vil das pessoas. Pare,
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