Page 572 - As Crônicas de Nárnia - Volume Único
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Jill estremeceu. Jamais se dera bem com gigantes, mesmo nos livros,
                  e já se encontrara com um durante um pesadelo. Notando depois a cara de
                  Eustáquio bastante esverdeada, achou que ele estava pior do que ela (o que
                  a fez sentir-se mais corajosa).

                         – O rei há muito me disse – falou Eustáquio –, quando andei com ele
                  pelos mares, que derrotara esses gigantes e os forçara à submissão.

                         –  Verdade  –  confirmou  Brejeiro.  –  Não  estão  mais  em  guerra
                  conosco. Desde que fiquemos do lado de cá do rio Ruidoso, não tocarão em
                  nós. Mas do lado de lá... Sempre pode haver um jeito. Se não chegarmos
                  muito  perto  deles,  se  algum  deles  não  perder  a  cabeça,  se  não  formos
                  vistos, poderemos caminhar um bom pedaço.

                         – Olhe aqui – disse Eustáquio, perdendo o controle, como costuma
                  acontecer com as pessoas amedrontadas. – Não acredito na metade do que
                  está falando; as camas da cabana também não eram tão duras nem a lenha
                  estava molhada. Aslam não nos teria enviado se o risco fosse tão grande.
                         Esperou que o paulama lhe respondesse enraivecido, mas não:

                         – É isso aí, Eustáquio. E assim que se fala. É ver a coisa pelo lado
                  melhor. Só que devemos ter muito cuidado com os nervos, já que teremos
                  de atravessar tantas dificuldades juntos. Não adianta brigar, pelo menos não
                  desde já. Sei que as expedições desse tipo acabam em geral desse modo:
                  um esfolando o outro antes da hora. Quanto mais tempo a gente suportar...

                         – Bem, se é tão pouca sua esperança – interrompeu o menino –, é
                  melhor ficar. Jill e eu podemos ir sozinhos...

                         – Não banque o burro, Eustáquio – atalhou a menina, apavorada com
                  a idéia de que o paulama pudesse tomar as palavras dele ao pé da letra.

                         – Não tenha receio – falou Brejeiro. – E claro que eu vou. Não posso
                  perder  essa  oportunidade.  Só  irá  me  fazer  bem.  Eles  sempre  dizem...  os
                  outros paulamas dizem... que eu sou muito volúvel; que não levo a vida
                  muito a sério. Já disseram milhões de vezes: “Brejeiro, você é todo empáfia
                  e fanfarronada, um brincalhão. Precisa aprender que a vida não é só rã e
                  enguia  na  barriga,  e  mais  nada.  Precisa  achar  algo  que  lhe  sofreie  um
                  pouco. Estamos falando pelo seu próprio bem, Brejeiro.” É o que dizem
                  sempre. Pois aí está a minha sorte: uma jornada para o Norte, na hora em
                  que  o  inverno  está  começando!  À  procura  de  um  príncipe  que
                  provavelmente não se encontra lá! Passando por uma cidade em ruínas que
                  ninguém nunca viu!... Não podia ser melhor! Se uma aventura dessas não
                  consertar um sujeito, é porque não tem mesmo conserto.
                         E esfregou as mãos de sapo como se estivesse falando em ir a uma
                  festa ou ao circo.
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