Page 575 - As Crônicas de Nárnia - Volume Único
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horroroso. E aquelas moitas desgrenhadas – devem ser ninhos de pássaros
                  – passariam por cabelos e barba. E aquelas coisas penduradas de cada lado
                  parecem  mesmo  orelhas.  Orelhas  monstruosamente  grandes,  mas  gigante
                  deve ter mesmo orelhas de elefante. E... ooooh!”

                         Ficou gelada. A coisa se mexia.

                         Era  de  fato  um  gigante.  Não  havia  mais  dúvida:  tinha  virado  a
                  cabeça.  Jill  chegara  a  perceber  a  cara  estúpida  e  bochechuda.  Eram
                  gigantes,  não  eram  rochas,  aquelas  coisas.  Uns  quarenta  ou  cinqüenta,
                  enfileirados.  Tinham  os  pés  pousados  no  fundo  do  desfiladeiro  e  os
                  cotovelos apoiados na borda, como fazem os preguiçosos na beirada de um
                  muro depois do almoço.

                         –  Em  frente!  –  cochichou  Brejeiro,  que  também  os  notara.  –  Não
                  olhem para eles! Aconteça o que acontecer, não corram! Cairão em cima de
                  nós como um raio.
                         E assim continuaram, fingindo que não tinham visto os gigantes. Era
                  como atravessar o portão de uma casa onde houvesse um cachorro feroz, só
                  que muito pior. Os gigantes não demonstravam raiva... nem bondade... nem
                  o menor interesse. Nem davam sinal de que tinham notado os viajantes.

                         Aí – zim, zim, zim –, um pesado objeto veio zunindo e um grande
                  calhau explodiu uns vinte passos na frente deles. Depois – pimba! – caiu
                  um outro, cinco metros atrás.

                         – Estão apontando para nós? – perguntou Eustáquio.

                         –  Não  –  respondeu  Brejeiro  –,  e  estaríamos  mais  seguros  se
                  estivessem. Estão tentando acertar ali, naquele monte de pedras à direita.
                  Não  vão  acertar  nunca.  Têm  uma  pontaria  desgraçada.  Passam  a  manhã
                  quase toda brincando de pontaria. É a única brincadeira que são capazes de
                  entender.

                         Foi um mau pedaço. A fila de gigantes parecia não acabar nunca, e
                  não  paravam  de  dar  pedradas.  E,  além  do  perigo  real,  as  caras  e  os
                  vozeirões já eram suficientes para apavorar qualquer um. Jill fez tudo para
                  não olhar.
                         Depois  de  quase  meia  hora,  os  gigantes,  pelo  jeito,  começaram  a
                  brigar. Foi o fim do concurso de pontaria, mas não é nada agradável estar a
                  um quilômetro de gigantes brigando. Agridem e escarnecem uns dos outros
                  com palavras sem sentido, de vinte sílabas cada uma. Berram, espumam e
                  saltam enfurecidos, fazendo a terra estremecer. Ferem-se uns aos outros na
                  cabeça com martelões de pedra. As cabeças são tão duras que os martelos
                  saltam, e os monstros deixam cair o martelo e uivam de dor com os dedos
                  machucados. Mas são tão estúpidos que voltam a repetir a mesma coisa um
                  minuto depois.
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