Page 580 - As Crônicas de Nárnia - Volume Único
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– E não poderia ser um esqueleto? – perguntou o paulama, com uma
entonação lúgubre. – Ou talvez, nada. Nada que fosse visível. Um alguém
invisível.
– Francamente, Brejeiro – falou Jill num sobressalto. – Você tem
cada idéia.
– Deixe-o para lá – disse Eustáquio. – Ele está sempre esperando o
pior, e está sempre errado.
Vamos pensar nos gigantes amáveis e chegar em Harfang o mais
cedo possível. Gostaria de saber a distância que nos separa do castelo.
E quase acabaram caindo numa daquelas brigas previstas por
Brejeiro: Jill e Eustáquio já tinham estado às turras antes, mas agora o
desentendimento era de fato sério. Brejeiro não queria ir para Harfang de
maneira nenhuma. Não sabia (disse) o que significava ser “amável” na
cabeçorra de um gigante. Além disso, segundo os sinais de Aslam, nada
havia a respeito de hospedar-se com gigantes, amáveis ou desagradáveis.
Por sua vez, as crianças (cansadas de ventanias, de chuvaradas, de aves
assadas nos acampamentos, do chão duro) estavam indiscutivelmente
decididas a uma visita aos gigantes amáveis. Por fim, Brejeiro acabou
concordando, mas sob uma condição: os dois tinham de prometer de pedra
e cal que, a não ser que a proibição fosse levantada, jamais revelariam aos
gigantes de onde vinham e que estavam à procura do príncipe Rilian. A
promessa foi feita e eles prosseguiram.
Depois da conversa com a dama, as coisas pioraram de duas
maneiras: o caminho era muito mais áspero e cruzava vales estreitos, onde
o vento norte os castigava; nada se encontrava que pudesse ser usado como
lenha e não havia bons lugares para passar a noite; o terreno era todo
pedregoso, causando dores nos pés durante o dia e dores no corpo todo
durante a noite.
Em segundo lugar, fosse qual fosse a intenção da dama ao referir-se
às delícias de Harfang, o efeito sobre as crianças não foi nada bom. Não
pensavam em outra coisa, só em camas quentes, banhos, jantares,
aconchego. Já nem falavam mais em Aslam ou no príncipe perdido. Jill
deixou de repetir os sinais todas as noites e manhãs. A princípio, dizia para
si que estava cansada demais; depois, simplesmente se esqueceu de tudo. A
idéia de passar uma boa vida em Harfang, em vez de mantê-los mais felizes
e animados, produziu o efeito contrário: aumentou-lhes a insatisfação,
tornando-os mais impacientes e irritados.
Uma tarde chegaram finalmente a um lugar onde o desfiladeiro
abria-se e escuros abetos erguiam-se de cada lado. Tinham atravessado as
montanhas. Diante deles estendia-se uma planície deserta e pedregosa;