Page 576 - As Crônicas de Nárnia - Volume Único
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De  qualquer  forma  foi  bom,  pois  depois  de  uma  hora  os  gigantes
                  estavam tão machucados que se sentaram e começaram a chorar. Sentados,
                  ficaram com a cabeça abaixo da borda do desfiladeiro, e assim não foram
                  mais vistos. Mas, mesmo um quilômetro à frente, Jill continuava a ouvi-los
                  uivar e abrir o berreiro, como se fossem bebês enormes.

                         Acamparam  naquela  noite  em  plena  charneca.  Brejeiro  ensinou  às
                  crianças como fazer o melhor uso dos cobertores, dormindo uma de costas
                  para  a  outra.  (De  costas,  uma  aquece  a  outra,  e  podem-se  jogar  os  dois
                  cobertores por cima.) Mas estava gelado mesmo assim, e o chão era duro e
                  encaroçado.  Disse-lhes  o paulama  que,  para  se sentirem  melhor,  bastaria
                  lembrar que seria ainda muito mais frio quando se aproximassem mais do
                  Norte. Mas isso não serviu de consolo.

                         Caminharam através de Ettin por muitos dias, poupando o toucinho e
                  alimentando-se  principalmente  de  aves  (não  eram,  naturalmente,  aves
                  falantes) que Eustáquio e o paulama derrubavam. Jill chegava a invejar a
                  habilidade  de  Eustáquio.  Como  havia  riachos  sem  conta  pelo  caminho,
                  água é que não faltava. Jill lembrou-se de que nos livros, quando as pessoas
                  se  alimentam  de  caça,  nunca  se  faz  referência  ao  trabalho  malcheiroso,
                  demorado e sujo que é depenar e limpar uma ave abatida. O melhor é que
                  não  tinham  encontrado  mais  gigantes.  Um  deles  os  viu,  mas  deu  uma
                  gargalhada gigantesca e continuou a tratar da vida.

                         Por volta do décimo dia, chegaram a um lugar no qual a paisagem
                  mudava.  Tinham  atingido  a  borda  norte  da  charneca,  que  dava  para  um
                  território mais íngreme e penoso. No fundo de uma encosta havia penhas:
                  além  destas,  uma  terra  de  montanhas  altas,  negros  precipícios,  vales
                  pedregosos, abismos tão fundos e estreitos que ficavam escuros, e rios que
                  jorravam de gargantas ressoantes para o fundo de sinistros despenhadeiros.
                  Não é preciso dizer que foi Brejeiro quem apontou para um  punhado de
                  neve nas encostas mais distantes.

                         – Mas haverá mais neve para o Norte, sem dúvida – acrescentou.
                         Levaram algum tempo para atingir o sopé da encosta. Olharam então
                  do alto dos penhascos para um rio que corria embaixo, de oeste para leste.
                  Ladeado de precipícios, era verde e sombrio, pontilhado de rápidos rios e
                  cachoeiras. O rugido das águas estremecia a terra.

                         –  O  melhor  de  tudo  –  disse  Brejeiro  –  é  que,  se  quebrarmos  o
                  pescoço ao descer do penhasco, estaremos salvos de morrer afogados no
                  rio.

                         – E aquilo ali? – disse Eustáquio de repente, apontando rio acima, à
                  esquerda. Todos olharam e viram o que menos esperavam – uma ponte. E
                  que ponte! Era um vasto e único arco transpondo o abismo e firmado no
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