Page 670 - As Crônicas de Nárnia - Volume Único
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– Bem – suspirou o rei, depois de alguns instantes. –Vamos em
frente e vejamos que aventura nos espera.
– É a única coisa que nos resta fazer, senhor –disse o unicórnio.
Naquele momento, nem ele nem o rei se deram conta da loucura que
estavam fazendo, indo avante só os dois. Sua precipitação, no entanto,
acabaria por trazer muitos males.
De repente, o rei inclinou-se, encostando-se no pescoço do amigo, e
disse, abanando a cabeça:
– Precioso, o que será de nós? Pensamentos horríveis começam a me
perturbar. Ah, se tivéssemos morrido antes de hoje! Teria sido melhor para
nós.
– Sim – disse Precioso. – Acho que vivemos demais. Não poderia ter
nos acontecido coisa pior.
Ficaram ali parados durante uns dois minutos e depois seguiram em
frente. De longe podiam ouvir o barulho dos machados devastando a
floresta, embora ainda não conseguissem ver nada, pois o terreno elevava-
se logo à frente deles. Quando alcançaram o topo, avistaram o Ermo do
Lampião; o rosto do rei ficou branco como cera.
Bem no meio daquela antiga floresta – a mesma floresta onde,
muitos anos atrás, cresciam árvores de ouro e de prata e onde certa vez uma
criança do nosso mundo plantara a Arvore da Proteção — já fora aberta
uma vasta clareira. Era uma faixa horrorosa, parecendo uma ferida aberta
na terra, cheia de sulcos barrentos por onde as árvores derrubadas eram
arrastadas para o rio. Havia uma porção de gente trabalhando em meio ao
estalar de chicotes; cavalos resfolegavam e bufavam arrastando as toras de
madeira. A primeira coisa que o rei e o unicórnio notaram foi que pelo
menos metade dos trabalhadores eram homens e não animais falantes.
Depois perceberam que aqueles homens não eram os louros narnianos,
mas, sim, barbudos e morenos homens da Calormânia, o país grande e cruel
que fica para lá da Arquelândia, ao sul do deserto. Não existia, é claro,
razão alguma para não haver calormanos em Nárnia, fossem eles
mercadores ou embaixadores, pois naqueles dias havia paz entre Nárnia e
Calormânia. O que Tirian não conseguia entender era por que havia tantos
deles ali, nem por que razão estavam abatendo as florestas narnianas.
Apertou ainda mais o punho da espada, enrolando a capa sobre o braço
esquerdo, e em questão de segundos já se encontravam no meio daqueles
homens.
Dois calormanos montavam um cavalo ao qual haviam atrelado um
tronco. O rei os alcançou justo no momento em que o tronco atolara numa
poça de lama.