Page 71 - As Crônicas de Nárnia - Volume Único
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com os nervos descontrolados. Alguém já ouviu um leão cantar?” Quanto
mais belo o canto, mais tio André imaginava ouvir rugidos. O negócio é
este: quando a gente quer se fazer de tolo, quase sempre consegue. Tio
André conseguiu. Passou a ouvir apenas rugidos na canção de Aslam.
Mesmo que quisesse voltar atrás, já era tarde. Quando afinal o Leão falou e
disse “Nárnia, desperte”, o tio não ouviu palavras; ouviu somente um
rosnado. Quando os bichos responderam, ouviu latidos, uivos, zurros,
miados. Quando caíram na risada... bem, você pode imaginar. Esse foi o
pior momento para tio André. Aquela zoeira infernal de feras sanguinárias
e esfomeadas! Depois, para arrematar-lhe a raiva e o terror, viu os outros
três seres humanos se encontrarem, na maior calma, com os outros animais.
“Imbecis!”, falou para si mesmo. “As feras vão comer os anéis junto
com as crianças, e nunca mais poderei voltar para casa. Mas que menino
egoísta este Digory! E os outros são da mesma laia. Se querem morrer, o
problema é deles. Mas... e eu? Será que não pensam nisso? Ninguém se
lembra de mim.”
Por fim, quando um bando de bichos veio correndo para o lado dele,
tio André virou as costas e também saiu em disparada. E agora podemos
todos verificar que de fato o ar do mundo jovem fizera muito bem ao velho.
Em Londres, já era velho demais para dar uma corridinha; em Nárnia,
correu a uma velocidade que daria para bater todos os recordes de corridas
de cem metros. Era de ver a aba do casacão revoando ao vento. É claro que
a velocidade de nada lhe valia. Muitos dos animais eram mais rápidos; pela
primeira vez na vida corriam e estavam doidos para exercitar os músculos.
“Corre! Corre!”, gritavam. “Deve ser o vau! Vamos cercar o vau!
Depressa! Agarra!”
Em poucos instantes alguns lhe tomaram a dianteira, fechando-lhe o
caminho. Outros o acuaram pela retaguarda. Por todos os lados tio André
via o terror. Chifres de enormes alces e o carão imenso de um elefante
sobrepunham-se à frente. Ursos muito sérios rugiam atrás. Leopardos de
olhar frio e panteras de feições sarcásticas (como imaginou) miravam-no,
agitando as caudas. O que mais o abatia era o grande número de bocas
escancaradas. Os animais ofegavam; para ele, no entanto, era fome.
Tio André pôs-se a tremer. jamais gostara de animais, dos quais em
geral sentia medo. Além disso, anos de experiências cruéis com os bichos
só fizeram com que mais os temesse e odiasse.
– Bem, Sr. Coisa – disse o buldogue, com seu jeito de homem de
negócios –, responda-me: você é animal, vegetal ou mineral?
Foi o que ele disse, na realidade; mas o que tio André ouviu foi:
– GRRR!